Folha de S.Paulo

Primárias no Chile decidem presidenci­áveis

Ex-presidente Sebastián Piñera, líder nas pesquisas, enfrenta disputa acirrada contra populista no campo da direita

- SYLVIA COLOMBO PARAGUAI BRASIL URUGUAI ARGENTINA

Aliança de partidos de esquerda é novidade do pleito de novembro; ex-jornalista outsider é favorita à indicação

Se a eleição presidenci­al chilena fosse nesta semana, um visitante desavisado ao país pensaria que o grande favorito ao pleito é o goleiro Claudio Bravo, do Manchester City e da seleção chilena. Isso porque, na disputa de pênaltis da semifinal da Copa das Confederaç­ões, o goleiro defendeu três bolas seguidas, e colocou seu time na final do torneio, neste domingo (2).

O rosto de Bravo não sai dos noticiário­s. “Chile, Bravo”, “Bravo, um Gigante” são apenas alguns dos vários títulos dedicados a ele em jornais e tablóides. Na TV, é infinita a repetição de imagens das defesas do herói do jogo, enquanto comentaris­tas derramam elogios à sua técnica.

Logo após a partida, um dos pré-candidatos da direita, o ex-presidente Sebastián Piñera, 67, soltou nas redes sociais elogios ao jogador e disse que, se eleito, atenderá a reclamação que o mesmo fez em uma entrevista pós-jogo. “Acolhendo o conselho de Bravo, vou remodelar o Estádio Nacional e fazer um museu que recorde os momentos épicos do futebol chileno.”

O que poderia ser apenas uma anedota, porém, transformo­u-se num problema sérioparaa­votaçãodas­eleições primárias, que ocorrem neste domingo e decidem qual será o representa­nte de cada força política para as eleições presidenci­ais, em novembro.

Isso porque a final do torneio, entre Chile e Alemanha, acontece no mesmo dia e, pelo horário chileno, justamente no momento em que se costuma verificar o maior número de eleitores nos centros de votação: o começo da tarde.

Segundo a Folha apurou, um dos assessores de Piñera disse que há muita preocupaçã­o em sua campanha, pois

Santiago

é no flanco da direita que a primária será mais acirrada.

O ex-presidente disputa o posto de candidato com mais dois oponentes, sendo o mais forte deles Manuel José Ossandón, 54, um líder populista de amplo apoio na periferia de Santiago.

Num país em que o voto não é obrigatóri­o, um domingo com o Chile jogando uma final de campeonato e a temperatur­a que promete estar abaixo dos 10 graus compõem um sério convite para ficar em casa.

“Não acho que mais de 10% das pessoas vão comparecer para votar”, diz à Folha o cientista político Fernando García Naddaf. “E quem mais perderá com isso será Piñera, que precisa desse respaldo.”

Isso porque a Nueva Mayoria, aliança que dava apoio ao governo, se pulverizou em duas candidatur­as independen­tes e não disputará primária. O candidato governista será o ex-jornalista e senador por Antofagast­a Alejandro Guillier, 64, enquanto os democratas-cristãos, que abandonara­m a coalizão, concorrerã­o com candidata própria, Carolina Goic, 44. ESQUERDA A novidade desta eleição será a estreia da Frente Ampla, uma aliança de partidos de esquerda formada nos moldesdoPo­demosespan­hol e da Frente Ampla uruguaia. Nela, haverá disputa na votação primária, mas encontrase disparada na frente a tambémex-jornalista­BeatrizSán­chez, 46, que disputará com osociólogo­AlbertoMay­ol,40.

A candidatur­a de Sánchez eratotalme­nteinesper­adaaté mesmo para ela. Há poucos meses, a jornalista foi procurada por algumas lideranças do movimento estudantil que protagoniz­ou as manifestaç­ões pela educação pública, que conquistar­am as ruas das principais cidades em 2011.

Como no Chile não é possível ser candidato a presidente com menos de 35 anos, nenhum desses líderes poderia se postular. Pediram, então, que Sánchez levantasse sua bandeira. Ela aceitou e vem conquistan­do apoios, devido à intensa campanha que vêm fazendo por ela dois jovens deputados oriundos desse movimento: Giorgio Jackson, 30 (leia texto nesta página) e Gabriel Boric, 31.

As pesquisas preliminar­es, ainda sem as candidatur­as definidas, dão vantagem pequena a Sebastián Piñera, com 25%. Alejandro Guillier está em segundo, com 21%.

DA ENVIADA A SANTIAGO

A nove meses de deixar o cargo pela segunda vez (não há possibilid­ade de reeleição direta no Chile), a presidente Michelle Bachelet, 65, vem recuperand­o popularida­de. No ano passado, atingiu seu ponto mais baixo, 18%.

A última pesquisa da Adimarklhe­deu31%,três pontos a mais do que há doismeses,jáconfigur­ando tendência de aumento, segundo o instituto.

Analistas ouvidos pela Folha creem que isso se deve ao fato de, nos últimos meses, a presidente ter acelerado as reformas prometidas, porém postergada­s nos últimos anos. Além disso, segundo a pesquisa, os escândalos de corrupção envolvendo membros de sua família ficaram para trás.

Em seu último pronunciam­ento anual no Congresso, em junho, Bachelet disse que seu governo não está terminado. Garantiu que seguirá impulsiona­ndo as reformas tributária­s, educaciona­l e trabalhist­a, ainda que tenha dificuldad­es em aprová-las.

Ela frustrou-se, porém, por não poder instalar uma Assembleia Constituin­te, uma de suas promessas, para substituir a Carta vigente, dos anos Pinochet (1973-1990).

Anunciou ainda, que, no segundo semestre, enviará ao Parlamento um projeto de lei para aprovar o casamento gay e esperavera­provadauma­lei do aborto que não puna a mulher que aborte por má-formação do feto, risco de vida da mãe ou estupro —hoje, o aborto é proibido sob quaisquer circunstân­cias no Chile.

Sebastián Piñera, hoje favoritoas­ucedê-la,écontrário a ambas as leis. (SC)

 ?? 21.mar.2017/AFP ?? O ex-presidente do Chile Sebastián Piñera (ao centro) saúda apoiadores durante o anúncio da pré-candidatur­a às eleições presidenci­ais de novembro
21.mar.2017/AFP O ex-presidente do Chile Sebastián Piñera (ao centro) saúda apoiadores durante o anúncio da pré-candidatur­a às eleições presidenci­ais de novembro

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