Folha de S.Paulo

INSISTÊNCI­A SEM RUMO

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Em Berilo, no paupérrimo Vale do Jequitinho­nha, dos 12 mil habitantes, ao menos 4.000 migravam para o interior de São Paulo para o corte de cana, segundo a prefeitura mineira. Sem esse mercado, parte tenta a colheita de café, laranja ou cebola, sem o mesmo rendimento. “O único emprego que tem aqui é de servidor público. Tirando isso, a sobrevivên­cia mesmo é Bolsa Família.”

Presidente da Associação dos Agricultor­es Familiares e Feirantes no Jequitinho­nha, José Nilson Araujo Cota diz que os reflexos da mecanizaçã­o são sentidos há oito anos e que a renda de três meses no café quase equivale à de um mês na cana.

O piso do cortador é de R$ 1.069,48 na região de Ribeirão. O pagamento, no entanto, é por produtivid­ade, ou seja, quanto mais o boiafria cortar, mais ganhará. Por tonelada, os valores pagos são de R$ 5,92 (cana queimada) e R$ 11,85 (crua).

Esse é um dos motivos, segundo a Pastoral do Migrante de Guariba (SP), para as duas dezenas de mortes contabiliz­adas de 2004 a 2007 supostamen­te provocadas pela exaustão nas lavouras. Além do excesso físico, porém, cachaça(umdosprodu­tosoriundo­s da cana) e drogas ficaram comuns no cenário rural.

Há, segundo o Ministério da Agricultur­a, 380 usinas no país, sendo 239 mistas (fazem açúcar e etanol) —159 estão em São Paulo, 48 na macror- a Ribeirão dura três dias.

Morador de uma casa com ar-condiciona­do, parabólica e com paredes sem reboque —mas com telhas, o que não é comum no bairro—, Raimundo Sousa da Silva, 45, usa diariament­e remédios para as dores na coluna que adquiriu na época de trabalho noscanavia­is.Háquatroan­os procura outras atividades.

“Foram12ano­sdecana,estou arrebentad­o da coluna. Comdoresem­emprego,omelhor foi vir embora. Sofrer por sofrer, melhor sofrer por aqui”, disse ele, que usa o terreno de casa para promover festas aos finais de semana.

Sem emprego nas lavouras desde 2008, José Vicente, 59, critica o vertiginos­o surgimento das máquinas e diz viver à espera da aposentado-

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