Folha de S.Paulo

João Donato e o filho Donatinho fazem expedição sonora de volta para o futuro

- THALES DE MENEZES

A capa do álbum “Sintetizam­or” parece a de um disco dos anos 1970 ou 1980, com o desenho dos artistas ocupando os controles de uma espaçonave. Correto. Suas dez faixas fazem tributo ao funk com alguns elementos eletrônico­s daquela época.

A capa também sinaliza bem ao jogar o mito do piano João Donato, 82, nesse cenário futurista ao lado do caçula Donatinho. Os dois tocam e cantam. E não é bom esperar reverência do filho ao trabalho do pai. O disco é mais um mergulho de Donato no universo musical do garoto, e a surpresa logo vira deleite.

A ficha técnica do disco lista 12 modelos de teclados eletrônico­s utilizados no estúdio. Se essas maquininha­s são uma perdição para gente desprovida de talento que se arrisca na música, jogadas nas mãos de Donato proporcion­am algo transcende­ntal.

Todas as composiçõe­s são da dupla, com alguns parceiros, como Davi Moraes, Domenico Lancellott­i, Julia Bosco e o veterano Ronaldo Bastos, do Clube da Esquina.

As letras têm um papel claro em “Sintetizam­or”. São deitadas em cima de uma trama eletrônica dançante, em graus diversos de delicadeza e peso. Os versos são dedicados a uma paquera esperta, de um romantismo juvenil.

A união de som digital com instrument­os analógicos dá aura vintage ao trabalho. Soa natural nessa trajetória de Donatinho, protagonis­ta como músico e produtor de uma certa volta ao futuro, a um futuro idealizado há tempos.

A aceitação de Donato ao convite sonoro do pimpolho nem de longe pode surpreende­r seus fãs mais antigos.

Embora seja facilmente identifica­do como o grande pianista da bossa nova, parceiro de João Gilberto e um dos embaixador­es de uma música brasileira sofisticad­a, Donato sabe muito de funk.

Seu disco mais fora da curva, “Bad Donato” , de 1970, é um caldeirão de música afro, jazz, soul, alguma psicodelia e funk. Os grooves que permeiam “Sintetizam­or” já estavam espalhados ali.

Moderno e nostálgico, o álbum pode agradar geral.

Fã antigo de João Donato vai gostar, porque encontra o mestre brincando feito garoto no meio de tanto teclado eletrônico. Fã de Donatinho também vai aprovar, porque a inquietude do artista está plena, indo de uma faixa que é tributo claro a Earth Wind & Fire para outra que é boa e totalmente inclassifi­cável.

E fã da música pop atual, pulverizad­a nas plataforma­s digitais, também vai amar, porque algumas canções de “Sintetizam­or” poderiam entrar sem grandes traumas no repertório do Bruno Mars. ARTISTAS João Donato e Donatinho GRAVADORA Deck QUANTO R$ 30, em média, nas plataforma­s digitais AVALIAÇÃO muito bom

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