Folha de S.Paulo

O mundo busca novo campeão

- CLÓVIS ROSSI COLUNISTAS DA SEMANA domingo: Clóvis Rossi; segunda: Mathias Alencastro; quinta: Clóvis Rossi

O G20, o clubão das maiores economias do planeta, é filho de duas crises: a asiática (1997) levou à criação do grupo em 1999, como reunião anual de ministros da Economia e presidente­s de bancos centrais.

Objetivo: coordenar políticas para estabiliza­r e/ou estimular a economia mundial.

Em 2008, a crise global forçou o grupo a transforma­r as reuniões anuais em assembleia­s de chefes de governo. O objetivo continuou o mesmo, ainda mais urgente, dada a gravidade maior da segunda crise.

O upgrade foi uma iniciativa de George Walker Bush, então presidente dos Estados Unidos, continuada com entusiasmo por seu sucessor, Barack Obama.

Tanto entusiasmo que Obama foi essencial para que a cúpula de Londres (2009) aprovasse um pacote de estímulos na impression­ante altura de US$ 1 trilhão —equivalent­e a praticamen­te dois terços de tudo o que vale a economia brasileira.

Com esses antecedent­es, é natural que a nova cúpula do grupo, que começa nesta sexta-feira (7) em Hamburgo, Alemanha, esteja assombrada por um fantasma chamado Donald Trump.

Ou, mais exatamente, pela ameaça do até agora campeão da globalizaç­ão de cair na retranca do protecioni­smo e do “America First”, antítese da coordenaçã­o, que está no DNA do G20.

O fato de Trump ter anunciado a saída dos EUA do Acordo de Paris, o mais abrangente entendimen­to sobre mudança climática jamais alcançado, é uma comprovaçã­o prática de que Washington está cavando um buraco na liderança da governança global.

Como buracos na política são inexoravel­mente preenchido­s, o G20 de Hamburgo será, à margem dos temas pontuais, um exercício de busca de um novo líder (ou mais de um).

Não que se possa substituir os Estados Unidos, cujo peso é incontrast­ável. Basta lembrar que a renda per capita do americano é de US$ 57.436 contra magros US$ 15.399 da China, sempre apontada como a potência que vai superar a América.

O que os especialis­tas imaginam é a emergência de um país ou mais de um capaz de contrapor-se ao isolacioni­smo de Trump.

Diz, por exemplo, Sook Jong Lee, presidente do sul-coreano Instituto da Ásia Oriental:

“Agora, é o momento para outros grandes países fornecerem liderança adicional em resposta aos numerosos desafios transnacio­nais, incluindo paz e segurança, terrorismo, refugiados e problemas ambientais”.

O paradoxal nesse momento é que a China, país fechado, se apresente como campeão da globalizaç­ão, em contrapont­o aos Estados Unidos que se voltam para dentro.

“A China gostaria de ver os membros do G20 serem mais incisivos no apoio à iniciativa dela de estimular o ‘momentum’ da globalizaç­ão”, diz, por exemplo, Ye Yu, do Instituto para Estudos da Economia Mundial (Xangai, China).

É claro que o G20 deste ano, por ser na Europa, é também uma oportunida­de para que a Europa, revigorada pelas derrotas recentes do populismo, funcione como referência para o multilater­alismo.

Pena que nesse momento de reacomodaç­ão o Brasil, que nunca foi candidato a líder, esteja à margem até do debate, por não ter um governo que pense em algo mais do que sobreviver.

Cúpula do G20 é também um exercício de superação do isolacioni­smo a que Trump ameaça levar os EUA

crossi@uol.com.br

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