Folha de S.Paulo

CRÍTICA Jodorowsky atinge o sublime e o infame

‘Poesia sem Fim’ é o segundo de série que pretende passar a limpo a vida do cineasta chileno

- SÉRGIO ALPENDRE

FOLHA

Instituiçã­o do cinema chileno, Alejandro Jodorowsky, nascido em 1929, logo se tornou um cineasta internacio­nal. Seus três primeiros longas são mexicanos, e muitos ainda os consideram seus melhores momentos no cinema: “Fando e Lis” (1968), “O Topo” (1970) e “A Montanha Sagrada” (1973).

Após mais três longas, dos quais o melhor é “Santa Sangre” (1989) e o mais curioso é “O Ladrão do Arco-Íris” (1990), com Omar Sharif e Peter O’Toole, Jodorowsky amargou um certo ostracismo.

Ficou por algum tempo mais conhecido como tarólogo do que como cineasta (menos, obviamente, entre os fãs ardorosos que adquiriu ao longo da carreira).

Essa situação mudou um pouco com “A Dança da Realidade” (2013), primeiro de cinco filmes que pretendem passar a limpo sua vida de forma poética. O pequeno Jodorowsky cresce em meio a personagen­s surrealist­as, incluindo uma mãe que se comunica exclusivam­ente como se estivesse numa ópera e um pai tirânico, retratado como um nazista.

O segundo longa da série surge em 2016 e estreia agora nos cinemas brasileiro­s. Chama-se “Poesia sem Fim”. A continuaçã­o não é só narrativa e temática: todo o aspecto visual é o mesmo, assim como o clima delirante e os movimentos de câmera ostensivos.

Vemos o alter ego do autor já como um jovem poeta, então com 20 anos, descobrind­o amizades, rivais, e livrando-se da sombra do pai. O próprio Jodorowsky continua aparecendo como a consciênci­a do protagonis­ta, num dos rasgos de poesia mais interessan­tes desses filmes.

Aos achados do filme anterior podemos acrescenta­r uma melhor dosagem da loucura e o surgimento de homens vestidos todos de negro manipuland­o objetos de cena, como no bunraku (teatro de bonecos japonês). O recurso já havia sido usado, brilhantem­ente, em “Duplo Suicídio em Amijima” (1969), do cineasta da nouvelle vague japonesa Masahiro Shinoda.

Percebe-se que os anos de ostracismo deixaram Jodorowsky um tanto duro, o que atrapalhav­a considerav­elmente “A Dança da Realidade”. “Poesia sem Fim” é mais belo e coeso. Por mais que esse tipo de filme peça, em parte, uma falta de coesão intenciona­l, uma construção mais disparatad­a e arriscada, faltava algum equilíbrio em toda a loucura.

Pode parecer contraditó­rio, mas assim é o cinema do diretor: ao mesmo tempo em que quase tudo é exacerbado (cores, interpreta­ções, apresentaç­ão (POESÍA SIN FIN) DIREÇÃO Alejandro Jodorowsky ELENCO Adan Jodorowsky, Brontis Jodorowsky, Leandro Taub PRODUÇÃO Chile/França, 2016, 16 anos QUANDO estreia nesta quinta (6) AVALIAÇÃO muito bom DIREÇÃO Rodrigo Gava PRODUÇÃO Brasil, 2015, livre QUANDO estreia nesta quinta (6) AVALIAÇÃO bom

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