Folha de S.Paulo

Pressionad­o, um Lula marcado como corrupto se arriscará indo ao ataque

Eficácia da estratégia, especialme­nte sobre o Judiciário que será criticado, parece duvidosa

- IGOR GIELOW

A condenação em primeira instância do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, por mais previsível que fosse por todos os agentes envolvidos, interrompe uma sequência de boas notícias para o líder petista.

Acuado pela Justiça, Lula tende a ir ao ataque, apostando na imagem de que é um perseguido político pelas instituiçõ­es e fazendo disso plataforma para sua tentativa de voltar ao Planalto em 2018.

Lula já fizera um ensaio geral desse discurso no caudaloso depoimento que deu a Sergio Moro há dois meses. Ali, fez mais uma defesa enfática de seu legado na Presidênci­a do que das acusações propriamen­te ditas.

Tal estratégia funciona muito bem para os convertido­s, ou seja, os 30% do eleitorado que seguem fiéis ao petista, mas a eficácia fora desse nicho que recuperou de 2016 para cá é duvidosa.

Concorrem em favor do petista, no momento o único nome capaz de manter o PT vivo como partido político, fatores sociais objetivos, como o alto desemprego, e outros mais sutis, como os 60% dos brasileiro­s que têm medo de sair à noite na rua, como apontou pesquisa recente do Datafolha.

A ideia lulista de associarse a um período de bonança para os mais pobres, independen­temente dos reais méritos do processo, promete alguma eficácia nesse campo.

Mas será suficiente para diminuir a rejeição na casa dos 45% amealhada por Lula? Uma condenação judicial, por mais disputada que seja e com possibilid­ade de cair ao ser analisada em instâncias superiores, cola de vez em Lula a imagem de corrupto. A combinação é fatal para um segundo turno.

Além disso, é importante destacar que uma campanha agressiva contra o Judiciário pode estimular ainda mais o rigor com que as sentenças costumam ser revisadas no Tribunal Regional Federal em Porto Alegre.

Acostumado­s a trabalhar em silêncio, juízes dessa instância intermediá­ria serão expostos a pressões novas, com efeitos imprevisív­eis.

Como já está anunciado, os movimentos sociais e organizaçõ­es sindicais à esquerda deverão tentar fazer barulho contra a imputabili­dade penal de Lula. Não parece algo que irá comover magistrado­s.

A condenação que foi mais celerement­e apreciada tomou seis meses dos juízes. Assim, num exercício, se Lula tiver a condenação confirmada nesse prazo, estaria fora da disputa eleitoral por força da Lei da Ficha Limpa.

O cálculo do PT inclui, como se sabe, essa possibilid­ade e a escalação de um preposto do ex-presidente para concorrer. Pode ser um petista avulso, como o ex-prefeito paulistano Fernando Haddad, ou um aliado inconfiáve­l como Ciro Gomes (PDT).

Mesmo condenado e, neste caso, talvez preso a depender do entendimen­to do TRF, Lula será eleitor importante.

De todo modo, está interrompi­da a maré de más notícias apenas para o Planalto de Michel Temer, o PMDB, PSDB e outros governista­s.

Até pelo ineditismo da sentença e a estatura pública do condenado, Lula voltará a estrelar o noticiário político-policiales­co, deixando as agruras do governo em segundo plano por algum tempo.

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