Folha de S.Paulo

Após sufocar golpe, Turquia beira autocracia

Um ano após tentativa de derrubar Erdogan, presidente mantém país sob estado de emergência e consolida poder

- DANIEL AVELAR

Expurgo continua com demissão e exoneração de suspeitos de apoiar clérigo opositor que se autoexilou nos EUA

Quando, na noite de 15 de julho de 2016, tanques ocuparam as ruas e caças davam rasantes nos céus da Turquia, o mundo voltou sua atenção para acompanhar o que se desenrolar­ia a seguir. Um ano depois, o golpe foi sufocado, mas o país ainda está sob estado de emergência.

No primeiro momento, houve apreensão e incerteza. Uns pensavam que o Exército turco agia para evitar um novo ataque terrorista, como as explosões que haviam deixado 42 mortos no aeroporto internacio­nal de Istambul menos de um mês antes.

Veio, então, a confirmaçã­o. Em mensagem veiculada na TV estatal, uma facção das Forças Armadas anunciou se tratar de uma iniciativa “para proteger a ordem democrátic­a”, que estaria sendo ameaçada pelo governo de Recep Tayyip Erdogan.

Os militares rebeldes mantiveram como refém o comandante do Exército, bombardear­am o Parlamento e o palácio presidenci­al em Ancara e atiraram contra civis.

Conclamado­s pelo presidente Erdogan, milhares foram às ruas para resistir à tentativa de golpe, a quinta e mais sangrenta da história recente da Turquia.

Os enfrentame­ntos deixaram 250 mortos e mais de 2.000 feridos. Na manhã seguinte, os golpistas se renderam, e Erdogan, que está no poder desde 2003 pelo Partido Justiça e Desenvolvi­mento (AKP, de orientação islamita e conservado­ra), anunciou a retomada do controle.

“Foi uma campanha terrorista para derrubar o governo democratic­amente eleito”, afirma Serkan Gedik, cônsulgera­l da Turquia no Brasil. “Todos se uniram contra o golpe. Não se tratava de defender um governante, mas a própria democracia.”

Segundo o governo, a ten- tativa de golpe foi orquestrad­a por seguidores do clérigo Fetullah Gülen, ex-aliado de Erdogan que atualmente vive exilado nos EUA. Ele nega ter envolvimen­to com a ação.

Sob a justificat­iva de combater os golpistas “de forma rápida e efetiva”, Erdogan estabelece­u um estado de emergência. A medida dá ao presidente o poder de governar por decreto, à revelia do Parlamento, e restringe liberdades individuai­s.

Desde então, 55 mil pessoas foram presas, inclusive líderes de partidos da oposição, e mais de 140 mil funcionári­os públicos foram exonerados, dentre os quais 10 mil militares, 8.500 professore­s e 4.400 juízes e promotores. Em um único decreto emitido nesta sexta (14), 7.300 servidores foram demitidos.

As autoridade­s também fecharam o cerco contra a imprensa, encerrando 149 veículos População: 79 milhões (equivalent­e a SP, MG e RJ juntos) Área: 784 mil km² (menor que o MT) PIB: US$ 857 bilhões (equivalent­e a SP, RJ e RS juntos) IDH: 71º (Brasil é 79º)

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Ozan Kose/AFP Cartaz em Istambul alude à tentativa de golpe sob o slogan “A Lenda do 15 de Julho”; governo mantém o país sob estado de emergência desde então

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