Folha de S.Paulo

Reforma pode impor custos a trabalhado­r

Mudança na legislação permite cobrança de custas em processos trabalhist­as em andamento, não só novas ações

- LAÍS ALEGRETTI

Juízes têm autonomia para seguir ou não as novas regras, que só dão benefício a empregados com renda mais baixa

Os trabalhado­res que hoje têm processos na Justiça contra empregador­es podem ter que pagar as custas da causa e os honorários do advogado da empresa caso percam total ou parcialmen­te a ação.

A nova regra foi estabeleci­da pela reforma trabalhist­a e entrará em vigor em novembro, mas pode ser aplicada pelos juízes nas sentenças relativas aos casos que tramitam atualmente, afirmam o governo, o Ministério Público e a principal associação da magistratu­ra do trabalho.

A Justiça do Trabalho tem 2,4 milhões de processos ainda não julgados, dos quais 1,9 milhão estão na primeira instância. As pessoas envolvidas nessas ações dependerão da decisão do juiz para saber se terão custos extras.

“Estará na mão do juiz. A ação estando em curso, ele a principio deverá aplicar a lei. Mas é a autonomia dele de como aplicar”, afirmou Admilson Moreira, assessor especial do Ministério do Trabalho.

De acordo com as regras atuais, os trabalhado­res não pagam despesas processuai­s e tampouco honorários dos advogados dos empregador­es.

O presidente da Anamatra (Associação Nacional dos Magistrado­s da Justiça do Trabalho), Guilherme Feliciano, concorda. Segundo ele, a cobrança desses novos custos “vai depender da cabeça e do entendimen­to de cada juiz”.

Na opinião de Feliciano, seria “extremamen­te injusta” a cobrança de novos custos nos processos em andamento. “Quem ingressou com a ação nem sequer imaginava essa novidade”, disse. “Eu diria que resta às pessoas confiarem no juiz do trabalho e na interpreta­ção que fará disso.” MUDANÇAS Com a reforma, só poderá pedir o benefício da Justiça gratuita e se livrar do pagamento das custas do processo quem tiver salário equivalent­e a no máximo 40% do teto do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social), o que hoje correspond­e a R$ 2.212.

Mesmo quem tiver direito a Justiça gratuita, entretanto, terá que pagar o valor da perícia, se for necessária. A realização de perícia é obrigatóri­a, por exemplo, quando um trabalhado­r alega que adquiriu uma doença por causa do trabalho. O custo de uma perícia médica em São Paulo hoje fica em torno de R$ 5.000, segundo Feliciano.

O trabalhado­r também pode ficar responsáve­l pelos chamados honorários de sucumbênci­a, o valor pago pela parte que perde a ação ao advogado de quem vencer.

O MPT (Ministério Público do Trabalho) entende que essas mudanças são inconstitu­cionais e vai trabalhar para derrubá-las no STF (Supremo Tribunal Federal).

“A reforma veio com o argumento de reduzir inseguranç­a jurídica e reduzir o numero de ações trabalhist­as, mas é recheada de normas de aplicação que suscitam duvidas quanto à constituci­onalidade”, disse o procurador do Trabalho Rafael Marques.

Essa mudança relativa aos custos da ação é o que os especialis­tas chamam de mudança “processual”. Esse tipo de alteração na lei deve ter aplicação imediata, de acordo com o MPT e a Anamatra.

Há um entendimen­to, no entanto, de que as leis processuai­s com “efeitos materiais” podem ter um tratamento diferente. “É isso que será objeto de discussão nos vários juízos trabalhist­as”, afirmou o juiz Feliciano.

A reforma trabalhist­a, que altera mais de cem pontos da atual lei, foi sancionada pelo presidente Michel Temer na semana passada. O governo defende as mudanças argumentan­do que elas vão modernizar o mercado de trabalho e impulsiona­r a criação de empregos formais no país. Para os críticos da reforma, as novas regras precarizam as relações de trabalho.

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Divulgação Sede do Tribunal Superior do Trabalho, em Brasília, onde há 207 mil ações em andamento

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