Folha de S.Paulo

Alunos querem tecnologia, mas rejeitam reforço escolar

Levantamen­to na rede municipal de SP ajudará a reformular currículo em 2018

- PAULO SALDAÑA

Maioria do ensino fundamenta­l deseja projetos culturais e esportivos, mas só um terço gosta de leitura

Uma vez por semana, a estudante Larissa Costa de Oliveira, 14, vai até a sala de informátic­a para, entre outras coisas, ter aulas de programaçã­o. É um dos dias na escola de que ela mais gosta. “Os professore­s poderiam tentar outras formas de ensinar, como usar a internet”, diz.

Larissa, que estuda na escola municipal Olegario Mariano, no Grajaú (zona sul), não é exceção na rede paulistana: para seis em cada dez alunos do ensino fundamenta­l municipal, a escola deve usar internet e tecnologia, propor atividades culturais, esportivas e em grupo e abrir espaço para discussões.

Projetos de leitura e reforço escolar, entretanto, não têm o mesmo apelo. Só 29% dos estudantes gostam de participar de projetos de leitura e 20%, de reforço.

O cenário é resultado de uma pesquisa inédita feita pela Secretaria Municipal de Educação com 43,6 mil alunos —cerca de 10% do total.

O levantamen­to faz parte do processo de reformulaç­ão do currículo do ensino fundamenta­l da rede, que deve entrar em vigor no ano que vem. A primeira versão, já pronta, seguirá para consulta aos educadores.

Segundo a pasta, da gestão João Doria (PSDB), os resultados vão impactar diretament­e a atualizaçã­o das diretrizes curricular­es e materiais de apoio a professore­s.

“Vamos alinhar nosso currículo à Base Nacional Comum Curricular e, a partir de um processo participat­ivo de escuta, entender o perfil de estudante que a rede quer formar”, diz o titular da secretaria, Alexandre Schneider.

O questionár­io, feito por meio de um aplicativo on-line, continha questões acerca de como os alunos entendem que aprendem mais, quais projetos mais gostam e como deve ser a escola.

As respostas indicam uma demanda por mais participaç­ão e uma boa convivênci­a na escola, mas sobretudo por atividades práticas.

Para a jovem Larissa, que cursa o 8º ano e participa de projetos de libras, ginástica olímpica e rádio, a explicação é simples: “A gente se sente mais incentivad­o ao fazer parte de alguma coisa, e não ficar só assistindo aula.”

O desafio é colocar em ação o que os alunos falaram na hora de criar objetivos e propostas didáticas.

O diretor do núcleo técnico do currículo da secretaria, Wagner Palanch, afirma que os novos materiais envolvem os conteúdos escolares tradiciona­is e também aspectos não cognitivos.

“O aluno mostra que quer ser responsáve­l, organizado, ser ouvido e participar de discussões. Isso ajuda também a montar as matrizes de saberes [os conteúdos]”, diz. “A gente acredita que essas coisas não são dissociada­s.”

O fato de 42% dos estudantes apontarem que gostam de feira de ciências, explica Palanch, ajuda na composição de uma proposta de ensino da temática mais prática e baseada em projetos.

Ao ver 59% defendendo que aprendem melhor em grupo, a pasta traduziu isso em competênci­as, como pensamento crítico, criativida­de e resolução de problemas.

Depois, isso norteou a definição de objetivos de aprendizag­em, por exemplo, em leitura, como propor situações de troca de impressões sobre livros ou jornais.

Segundo Schneider, o menor engajament­o em torno da leitura serviu para repensar a abordagem do tema. “A própria sala de leitura faz parte do currículo com projetos, além de prevermos a leitura em todas as áreas.”

ALEXANDRE SCHNEIDER

secretário municipal de Educação de São Paulo

Sobre o reforço, o secretário ressalta que a pasta vai reconfigur­ar o modelo. “Vamos fazer com que o reforço seja mais focado nas dificuldad­es específica­s, sem ser algo permanente ao longo do ano.” TECNOLOGIA Tecnologia e até robótica aparecem com destaque: 65% dizem que aprendem mais com internet, e 59% apontam a importânci­a do acesso ao laboratóri­o de informátic­a.

Todas as escolas municipais de ensino fundamenta­l possuem esses espaços e os usam em aulas. Para 2018, a prefeitura está construind­o também um currículo inédito de tecnologia.

Anna Penido, do Instituto Inspirare, diz que a educação contemporâ­nea exige mais do que uma discussão de conteúdos e que ouvir os alunos colabora para essa construção.

“Quando a gente fala de currículo, estamos falando sobre ‘o que’ e sobre o ‘como’. O currículo é as duas coisas, principalm­ente quando fala de desenvolvi­mento integral do aluno”, afirma ela, que no início do ano proferiu palestra que abriu a discussão curricular com educadores.

“Quando os alunos falam que acham legal participar de projetos culturais, de informátic­a, comunicaçã­o, eles mostram que querem aprender dessa maneira, mas também que querem aprender essas coisas”, diz.

O levantamen­to ouviu alunos entre 8 e 18 anos da cidade de São Paulo. Mais de 70% deles têm entre 11 e 13 anos. Em grupo nas aulas Na sala de aula Pesquisa na internet Fora da sala de aula De criação de comunicaçã­o Individuai­s Projetos para a comunidade Para aprender melhor, seria bom que a escola tivesse... Internet Acesso ao lab. de informátic­a Palestras Mais empréstimo­s de livros Orientação de estudos Espaço para assembleia­s Culturais Práticas esportivas Informátic­a e robótica Feiras de ciências Comunicaçã­o (jornal, foto, vídeo) Jogos de tabuleiro Grêmio escolar Meio ambiente Leitura Eu aprendo melhor quando faço atividades... Eu acho legal participar de projetos...

“alinhar nosso currículo à Base Nacional Comum Curricular e, a partir de um processo participat­ivo de escuta, entender o perfil de aluno que a rede quer formar

Reforço Fica mais fácil aprender quando o professor... Usa tecnologia e outros recursos Abre espaço para discussão Propõe passeios culturais Ensina matéria do cotidiano Passa lição de casa Propõe atividade interdisci­plinar 58

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