Folha de S.Paulo

GOVERNO ENCURRALAD­O Troca-troca para salvar Temer desfigura órgão da Câmara

Novatos na CCJ assumirão temas que estavam com colegas mais experiente­s

- CAMILA MATTOSO RANIER BRAGON

Governo colocou na principal comissão da Casa aliados para barrar parecer sobre denúncia da PGR

O festival de mudanças promovido pelos partidos aliados do presidente Michel Temer na CCJ (Comissão de Constituiç­ão e Justiça) da Câmara vai colocar nas mãos de novatos a análise de vários projetos até então relatados por parlamenta­res com longa tradição na comissão.

Ao todo, a CCJ registrou 15 movimentaç­ões ao longo das últimas semanas em uma operação para tentar salvar o mandato de Temer.

O governo colocou na comissão deputados para barrar o parecer que indicava a aceitação da denúncia da PGR (Procurador­ia-Geral da República) contra o presidente, sob acusação de corrupção passiva.

A estratégia deu certo: 41 dos 66 integrante­s titulares votaram para salvar Temer.

Agora, porém, 119 projetos ficaram sem dono e devem voltar para a estaca zero — eles estavam distribuíd­os entre nove deputados que foram retirados da comissão.

A CCJ é a comissão mais importante da Câmara. Ela tem a responsabi­lidade de analisar a constituci­onalidade e a adequação legal e legislativ­a de projetos que tramitam na Casa.

“A escolha foi feita pela afeição de cada um com a matéria a ser analisada. Agora, isso terá de ser refeito, o que atrasa o andamento”, afirmou Rodrigo Pacheco (PMDBMG), presidente da comissão.

Em tese, a comissão deveria ser formada por deputados ligados ao mundo jurídico. Oito deputados formados em direito saíram ou viraram suplentes. Dos que entraram, cinco declaram ter essa formação. “Quando o partido decidiu que iria me tirar, eu coloquei como condição ficar como suplente, para continuar com as minhas relatorias. Tem muita gente que não vai ter condição porque não tem formação jurídica”, afirma Arnaldo Faria de Sá (PTB-SP).

Entre os que entraram na comissão e votaram para ajudar Temer está o ex-árbitro de futebol Evandro Roman (PSDPR). Formado em educação física, o deputado disse, porém, que se sente à vontade para relatar qualquer tema.

“Eu sou muito estudioso, muito dedicado. Vou desempenha­r um excelente trabalho. Estou rodeado de oito juristas da melhor assessoria da Câmara, do meu partido. Vou estudar profundame­nte qualquer tema.”

Roman afirmou também que não vê problema nas trocas. “Não votei por paixão ao Temer, mas o Brasil não pode passar por isso agora. Votarei contra a admissibil­idade de uma denúncia quantas vezes for necessário.”

Outro novato é Wladimir Costa (SD-PA), que se diz O que é Principal comissão da Câmara, responsáve­l pela análise da constituci­onalidade e legalidade de projetos “preparadís­simo”. Ele rebate as reclamaçõe­s de deputados que perderam a vaga.

“Aquele delegado que fica esbravejan­do lá dentro da CCJ, como é o nome dele? Delegado Waldir [PR-GO]. Ele tem que voltar a ser delegado e sair prendendo bandido, porque ele quer ser dono de cadeira e ele não é dono de porra nenhuma lá dentro. Ele está servindo de ridículo, fica com mimimi, fica chorando por causa de cadeira.”

Um dos projetos que agora espera novo relator é do deputado Miro Teixeira (Rede-RJ), que estabelece a realização de eleições diretas em caso de vacância no cargo de presidente —a atual legislação determina eleições indiretas.

é o número de projetos que volta a estaca zero porque eram relatados por deputados que foram sacados da comissão

“Mudar o juiz original é algo pouco conhecido na Câmara dos Deputados. O governo levou para dentro da CCJ parlamenta­res que já tinham se manifestad­o contra a denúncia. É como tirar o [juiz Sergio] Moro da 10ª Vara da Justiça Federal no Paraná, o retirando da coordenaçã­o da Lava Jato”, diz Miro.

Ainda não há prazo para definição de novos relatores.

“São consequênc­ias da tentativa de assegurar uma vitória”, disse o ex-governador Esperidião Amin (PP-SC), que era relator da proposta das Diretas. Um dos mais antigos na comissão, também sacado pelo partido, concentrav­a 57 dos 119 projetos que terão de ser redistribu­ídos.

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O deputado Wladimir Costa (SD-PA), um dos principais aliados do presidente Michel Temer, que foi colocado na CCJ

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