Folha de S.Paulo

GOVERNO ENCURRALAD­O Maia tenta se livrar da pecha de traidor para ficar no jogo

Sucessor imediato caso Temer seja afastado do Planalto, ele está mais discreto

- MARINA DIAS

Deputado afastou-se de parlamenta­res da oposição e jantou duas vezes com o presidente

Nos últimos dias, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), fez aquele que pode ter sido o mais importante cálculo político de sua vida pública. Para se manter como opção a Michel Temer, deixou que o pragmatism­o prevaleces­se sobre a ambição de se tornar o homem mais poderoso do país.

Sucessor imediato da Presidênci­a da República caso Temer seja afastado do cargo, o deputado viu seu ânimo com a possibilid­ade de assumir o Palácio do Planalto aumentar no mesmo ritmo em que a pecha de “traidor” era vinculada à sua imagem.

Irritado, admitiu a pessoas próximas ter entendido que, caso passasse a ideia de que traiu e ajudou a derrubar o presidente, seu dia seguinte como inquilino do Planalto seria “um inferno”.

Maia decidiu comandar uma sutil mudança de estratégia no seu comportame­nto e no de seus principais interlocut­ores, os deputados Heráclito Fortes (PSB-PI), Benito Gama (PTB-BA) e Fernando Monteiro (PP-PE).

Diminuiu os encontros em sua residência oficial para tratar de um eventual cenário pós-Temer, afastou-se de parlamenta­res da oposição, disse que nunca pediu votos contra o presidente e jantou duas vezes com ele na semana que passou.

Maia tinha se incomodado especialme­nte com dois episódios nos últimos 15 dias: o assédio de Temer aos dissidente­s do PSB, que negociavam migrar para o DEM (partido do presidente da Câmara), e os recados de que, caso assuma o Planalto, a PGR (Procurador­ia-Geral da República) poderia centrar nele todo o seu poder de fogo.

E foi o próprio presidente o portador dessa análise. Na manhã de domingo (9), quando recebeu Maia no Palácio do Jaburu num clima de poucos amigos, Temer fez a avaliação de que os procurador­es não deixariam o possível sucessor em paz.

O raciocínio, repetido na casa de Maia no dia seguinte pelo líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDBRR), é de que as investigaç­ões querem jogar na vala comum toda a classe política.

O presidente da Câmara é alvo de dois inquéritos no STF (Supremo Tribunal Federal) resultante­s de colaboraçõ­es premiadas de ex-executivos da Odebrecht. Segundo delatores, ele recebeu repasses para sua campanha em 2008, para a de seu pai, em 2010, além de R$ 100 mil em 2013 para ajudar na aprovação de uma medida provisória que beneficiar­ia a empreiteir­a, o que o deputado nega.

Aliados contam que Maia disse apenas que era necessário cuidar do problema do presidente, que precisa barrar, no plenário da Câmara, a denúncia por corrupção passiva apresentad­a contra ele pela PGR.

A oposição precisa dos votos de 342 dos 513 deputados para aprovar a denúncia. Se isso acontecer, Temer é afastado por 180 dias, durante seu julgamento pelo STF, e Maia assume interiname­nte.

Baseado no termômetro dos deputados, o presidente da Câmara colocou seu cálculo em prática e fez com que o clima esfriasse um pouco.

A cautela dos parlamenta­res, que acreditam que Temer pode se salvar na primeira denúncia, mas que terá mais dificuldad­e em passar por outras duas que a PGR ainda pode oferecer contra ele, se dá à espera dos efeitos das possíveis delações de Eduardo Cunha (PMDB-RJ) e de seu operador, Lúcio Funaro.

Ambos prometem citar o presidente e o núcleo do governo, exigindo o apoio da base aliada em um ambiente ainda mais desgastado.

Com o cenário incerto e a natural expectativ­a de poder a seu redor, Maia só não faz questão de esconder a ponte que estabelece­u com o ministro Henrique Meirelles (Fazenda), fiador da política econômica.

Em dez dias os dois se encontrara­m duas vezes, e o ministro antecipou ao chefe da Câmara o aumento do imposto sobre os combustíve­is, anunciado na quinta (20).

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Pedro Ladeira - 20.jul.2017/Folhapress Rodrigo Maia e Michel Temer em reunião no Planalto

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