Folha de S.Paulo

A lógica da ação coletiva

- SAMUEL PESSÔA COLUNISTAS DA SEMANA segunda: Marcia Dessen; terça: Nizan Guanaes; quarta: Alexandre Schwartsma­n; quinta: Laura Carvalho; sexta: Nelson Barbosa; sábado: Marcos Sawaya Jank;

EM 19 de junho, o procurador-geral de Justiça do Estado de São Paulo, Gianpaolo Smanio, argumentou que o ajuste fiscal não pode ser feito no orçamento da Justiça. Smanio considera que o gasto com Justiça é investimen­to, e não despesa.

O fato de nosso Judiciário custar, como proporção do PIB, de quatro a seis vezes mais do que o Judiciário de qualquer país da OCDE não sensibiliz­a o procurador.

Transcorri­do exato um mês, em 19 de julho, no mesmo espaço da Folha, o presidente da Firjan, Eduardo Eugênio Gouveia Vieira, argumentou que a contribuiç­ão compulsóri­a de 2,5% sobre a folha de salários que financia boa parcela da atividade das instituiçõ­es do Sistema S se justifica em razão dos elevados retornos sociais das atividades empreendid­as por essas instituiçõ­es.

Em ambos os casos, não há preocupaçã­o com o custo e o benefício. Basta haver algum benefício. Ajuste fiscal bom é ajuste fiscal sobre os outros.

Recentemen­te, a Defensoria Pública da União requereu no STF a sua inclusão como colaborado­ra nos diversos processos de inconstitu­cionalidad­e da emenda constituci­onal que estabelece­u um teto para o cresciment­o do gasto primário da União. A justificat­iva é que, para melhor servir a população, a Defensoria Pública precisa de mais recursos.

Temos visto —por parte dos funcionári­os do BNDES e das associaçõe­s empresaria­is— fortíssima reação contrária à criação da TLP (Taxa de Longo Prazo), iniciativa que trará transparên­cia às operações do BNDES. A TLP retira do banco o poder de emprestar com subsídios sem que estes tenham sido avaliados e aprovados pelo Congresso Nacional.

A retórica das corporaçõe­s é travestir o seu interesse particular no interesse da sociedade.

Além disso, as corporaçõe­s demonstram inconsistê­ncia. Se é para manter todos esses gastos, como fazer campanha pela queda da carga tributária? Como a Fiesp pode colocar um pato na frente de seu prédio e simultanea­mente ser contra o fim da contribuiç­ão compulsóri­a de 2,5% para financiar o Sistema S e ser contra a criação da TLP?

A OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) foi contrária à PEC dos gastos. Agora, no dia 18, divulgou nota contrária à subida do imposto sobre a gasolina de R$ 0,41 por litro.

Subtende-se que, para todas essas corporaçõe­s, há despesas que podem ser cortadas e receitas que podem ser levantadas de forma muito fácil, com fortíssimo impacto positivo sobre o Orçamento.

Os candidatos óbvios são: os juros pagos aos banqueiros, a corrupção e a isenção de lucros e dividendos no Imposto de Renda da Pessoa Física.

Já escrevi diversas vezes sobre juros. Apesar de bem salgada, essa conta é bem menor do que se imagina. Se considerar­mos juros reais pagos excluindo o IR que incide sobre a correção monetária da dívida, trata-se de uma conta de 2% a 3% do PIB.

O combate à corrupção é necessário, mas longe de ser a panaceia de R$ 200 bilhões por ano alardeada pela procurador­a da República Thaméa Danelon no mais recente programa “Roda Viva”, da TV Cultura.

Finalmente, a isenção da distribuiç­ão de lucros e dividendos do IRPF é função da elevada alíquota que praticamos no Brasil na pessoa jurídica. Há algum espaço para aumentar a tributação, mas certamente muito menos do que se imagina.

Teremos que atuar em todas as margens. Não há saída simples, ao contrário do que pensam as corporaçõe­s.

Como a Fiesp pode pôr um pato no prédio e ser contra o fim dos 2,5% de contribuiç­ão obrigatóri­a para o Sistema S?

SAMUEL PESSÔA,

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