Folha de S.Paulo

A contragost­o, Venezuela elege Constituin­te

Votação de hoje convocada por Maduro é rejeitada por 72,7% da população, que protesta com barricadas nas ruas

- SYLVIA COLOMBO BRASIL

Assembleia prevê cotas para setores ligados ao chavismo e diminui representa­tividade de cidades pró-oposição

Um homem de cabelos grisalhos segura um bastão de beisebol e, parado no meio da rua, grita aos que chegam de carro, de moto ou caminhando: “Por aqui, só passa morador.”

Detrás dele, há uma barricada composta de sacos com pedras e destroços de concreto. Alguns garotos se perfilam perto dele, uns têm o rosto tapado, e vão fazendo a triagem dos que podem usar a via.

A reportagem da Folha flagrou cenas parecidas nos bairros de Las Mercedes, Chacao e Chuao. São os “trancones”, nova modalidade de protesto populariza­da em Caracas. Essas barricadas podem ser produzidas com cordas amarradas em postes, pedaços de concreto e até sacos de lixo cheios de algum material pesado.

Desde que a repressão contra manifestan­tes começou a ficar mais dura, deixando um saldo que já supera cem mortos, moradores dos bairros de classe média e alta de Caracas começaram a adotar essa nova forma de pressionar o presidente venezuelan­o, Nicolás Maduro.

O objetivo é evitar a eleição da Assembleia Constituin­te, que ocorre neste domingo (30), e levá-lo a renunciar.

Na prática, as barricadas inviabiliz­am o trânsito da cidade. Se até pouco tempo atrás o principal problema de Caracas era a mobilidade devido aos gigantesco­s engarrafam­entos, hoje é difícil se locomover por causa dos “trancones”, que encheram a cidade de moradores andando de moto ou a pé.

“Esta moto é do meu filho, eu nem sabia usar”, conta o empresário José Valdivia, 52, que voltava do escritório com um colega na garupa.

Outros caminham longas 912.050 km² (pouco maior que MT) 31.028.637 (2016)* (MG e RS somados) 0,767 (71º; Brasil é 79º) -7,1%* 720,5%* 25,3%* 81,8%** distâncias, sozinhos ou em grupo, como num filme apocalípti­co de ficção científica.

Devido a uma greve convocada nos últimos dias, pouquíssim­os estabeleci­mentos comerciais permanecer­am abertos nos dias pré-eleição. RECHAÇO Segundo Maduro, a Constituin­te ampliará benefícios e protegerá o país do ataque àsuaeconom­ia,supostamen­te orquestrad­o pelos EUA.

Seu principal desafio, porém, será entusiasma­r as pessoas a votarem e superar a marca de 7,5 milhões de venezuelan­os que, segundo a oposição, foram às urnas no dia 16 de julho para pedir em um plebiscito sem valor legal que esta eleição não ocorra.

Estimativa feita pelo instituto de pesquisa ORC colocou os votantes em ao menos 4 milhões dos 19 milhões de eleitores do país —um percentual alto consideran­do que a consulta era informal e não teve aval do órgão eleitoral, chavista.

Segundo o instituto Datanalisi­s, 72,7% dos venezuelan­os se opõem à Constituin­te.

Convocada por decreto, a votação terá um representa­nte por cidade pequena e dois nas maiores —o que dá vantagem a Maduro, uma vez que o governo é mais popular no interior, e a oposição, mais forte em Caracas e nas grandes cidades.

Além desses 364 representa­ntes, elaborarão a nova Carta 181 membros de organizaçõ­es sociais e estudantis alinhados ao governo.

Vestindo uma camiseta da seleção venezuelan­a e um pano branco na cabeça, Eliecer Baptista, 21, diz que “desde que tenho consciênci­a da minha cidadania o regime é este, e o país só piora. Isso precisa mudar.”

Baptista faz parte do La Resistenci­a, grupo de jovens que têm se destacado nas manifestaç­ões, às vezes de forma violenta. “Não gosto de tapar a cara, quero que saibam que sou eu protestand­o, mas se depois vierem atrás de minha família, o que faço? Não tenho alternativ­a.”

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Oscar González Grande/Folhapress Homem passa por local em Caracas onde foi montada barricada; multidões em protestos agora dão lugar a trincheira­s

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