HENRIQUE CAPRILES, 45 Constituiçõesevoluem, Maduropõecordano diz prefeito de Caracas pescoço, diz Capriles
Para líder chavista, existe muita “pós-verdade” no discurso de que a Venezuela não é uma democracia Para líder opositor, Constituinte é ‘cartada desesperada’, que deve acelarar o processo político do fim do chavismo
Rodríguez condena a violência nos protestos, em que já morreram mais de cem, mas aponta a oposição como culpada
“Nós, venezuelanos, adoramos votar”, disse no final da tarde deste sábado (29), o prefeito de Caracas, o chavista Jorge Rodríguez. “Nesses últimos 17 anos, votamos 20 vezes. Há muita pós-verdade no discurso de que a Venezuela não é uma democracia. Isso não é verdade.”
Para justificar a necessidade apresentada pelo presidente Nicolás Maduro de redigir uma nova Carta para opaís,Rodríguezafirmouque “as constituições evoluem com seus povos, e a nossa, que achamos que é uma das mais perfeitas do mundo, também deve progredir”, explicou.
As “evoluções” da nova Carta Magna, afirma Rodríguez, estão em mais garantias de proteção aos jovens e às mulheres.
“Há muita satanização com relação ao que o presidente Maduro pretende com a nova Constituição. Os direitos universais estarão garantidos, o direito ao sufrágio universal, as garantias democráticas permanecem.”
Segundo Rodríguez, a nova Carta trará estímulos para que a economia venezuelana deixe de depender exclusivamente do petróleo.
“Precisamos diversificar a produção, preservando a propriedade privada. Precisamos também proteger o país do contrabando, tudo isso estará contemplado”. OPOSIÇÃO O prefeito condenou as barricadas colocadas em vários bairros de Caracas nos últimos dias. “Uma coisa é protestar, outra é impedir crianças de irem à escola, médicos de atenderem pacientes.”
Condenou a violência cujo resultado foram mais de 100 mortos nos últimos quatro meses, mas aponta a oposição como culpada.
“O presidente Nicolás Maduro nunca se negou ao diálogo. A própria oposição queria uma nova Constituição, mas nunca se pôs de acordo. Pois o presidente Maduro, que tem legitimidade popular e um mandato até janeiro de 2019, está em seu direito de fazê-la.”
Sobre as críticas que lê e ouve vindas do exterior, Rodríguez diz que “há uma campanha internacional contra a Venezuela” e se diz “orgulhoso de que o presidente americano, Donald Trump esteja contra nossas ações, ele que perdeu a eleição dos Estados Unidos no voto popular”.
Ele pensa algo parecido a respeito do Brasil: “ninguém elegeu o atual presidente do seu país.”
E acrescenta que espera “que se restitua logo a democracia no Brasil para que os dois países voltem a se relacionar bem novamente”.
O prefeito acha que a suspensão da Venezuela do Mercosul foi “um verdadeiro golpe de Estado” e se deu por conta do giro ideológico para a direita da maioria dos países integrantes do bloco.
“Nós nos consideramos parte do Mercosul e o bloco não deveria excluir um país por diferenças ideológicas.”
Afirma também que considera “uma hipocrisia” a postura atual do bloco, “pois quando a maioria dos países da região eram de esquerda, nós não pedíamos que a Colômbia, que tinha um governo de extrema-direita como o de Álvaro Uribe, ficasse de fora dos mecanismos em que todos participavam.”
Sobre as declarações do presidente colombiano, Juan Manuel Santos, de que não reconheceria a Constituinte venezuelana, Rodríguez disse: “amanhã irão votar na Venezuela mais pessoas do que as que elegeram percentualmente Santos.” (SYLVIA COLOMBO)
Governador de Miranda diz que Lula e Dilma poderiam ter alertado o presidente sobre o rumo que o país tomava
“Maduro está colocando uma corda no pescoço com essa Constituinte”, disse à Folha o líder opositor Henrique Capriles, 45, em entrevista neste sábado (29) no estúdio onde grava seu programa de internet, em Caracas.
“É sua última cartada política, equivocada e desesperada, e que vai acelerar um processo político que significará o fim do chavismo”, disse. Para Capriles, que concorreu contra Maduro e perdeu em 2013, o presidente poderia “ter lavado um pouco a sua cara” se desistisse da Constituinte. “Ele conseguiria apresentar-se como um líder que tem alguma preocupação com a democracia. Agora, é inevitável que o mundo o veja como ditador.”
Apesar de sempre ter sido opositor do chavismo, Capriles considera que Hugo Chávez (1954-2013) não teria deixado a crise econômica e política atingir o país tão fortemente. “Não que ele fizesse um movimento para deixar o poder, mas saberia dar a volta nesse problema, jogar com atores internacionais, negociar com a oposição. Ele tinha mais habilidade política.”
Segundo o líder opositor, outro erro de Maduro é crer que o isolamento do resto da América Latina pode não trazer más consequências ao país. “Por que não dialogar com o Mercosul? Por que achar que ter Colômbia, México e EUA em desacordo com o que fazemos pode fazer bem à economia? Isso é loucura.”
Para entrar no “bunker” político de Capriles, é preciso passar por dois seguranças que custodiam uma porta de ferro sempre fechada, de um edifício que já foi alvo de ataques e chegou a ser parcialmente incendiado.
O governador de Miranda, porém, chega caminhando pela rua, que nesta tarde está toda bloqueada por barricadas e com intensa movimentação de manifestantes e da Guarda Nacional Bolivariana. Sorridente, se diz otimista com o futuro do país.
“Não é que eu esteja comemorando esse erro político de Maduro, que vai ter um custo social e econômico grande para a Venezuela. Mas, a partir de agora, começa um processo de deterioração ainda maior de sua base de apoio. E, quando se ofereça novamente a oportunidade de uma negociação, Maduro vai estar mais frágil.”
Capriles considera que a tentativa de negociação tendo como mediador o ex-premiê espanhol José Luis Zapatero era uma farsa e comemora não ter ido para a frente. Crê que daria sobrevida ao governo e que calaria a oposição com “uma espécie de carta de boas intenções, que não seria cumprida depois.” CRÍTICAS AO BRASIL “O Brasil poderia ter ajudado mais a Venezuela. Lula e Dilmaacharamqueconversar com a Venezuela era dialogar apenas com o chavismo”, disse. “E fui defensor do Lula, não éramos contra o que o PT estava fazendo em seu governo. Mas eles só quiseram relacionar-se com os venezuelanos por meio do chavismo”.
Capriles também julga que houve omissão por parte da maioria dos líderes latinoamericanos, que poderiam ter alertado Maduro da seriedade da situação.
“Lula e Dilma, se eram tão nossos amigos, por que não o aconselharam? Evo Morales tampouco.Oúnicoquesemanifestou com um alerta contundente foi Rafael Correa, porque é um líder muito mais preparado e nunca deixou que o ‘socialismo do século 21’ levasse o Equador para o caminho da Venezuela”, disse.
Impedido politicamente pelo chavismo de participar de eleições nos próximos 15 anos, Capriles diz não pensar em seu futuro político particular. “Penso apenas em como vamos enfrentar esse trecho difícil que nos toca, que é aagoniadochavismoeoagravamento da crise, mas creio que a Constituinte acelera o processo do fim do governo Maduro.” (SYLVIA COLOMBO)