Folha de S.Paulo

MINHA HISTÓRIA SEGUNDO TEMPO

Sobreviven­te do acidente do voo Chape, lateral preparase para volta aos gramados após 8 meses de recuperaçã­o

- , EM

COLABORAÇíO PARA A CHAPECÓ

Após o acidente, o meu principal objetivo sempre foi voltar a andar. Não pensava muito que poderia jogar futebol naquele momento.

Com o passar do tempo fui visualizan­do que a possibilid­ade de voltar ao futebol era grande, embora os médicos sempre fossem muito sinceros comigo e não me dessem garantias que voltaria a jogar.

A partir do momento que saí do hospital aqui em Chapecó eu coloquei na cabeça que jogaria. Fiz a minha fisioterap­ia em casa e na pisci- na. Depois fui para o Juventude, em Caxias do Sul, que foi onde eu comecei a jogar. Lá, fiz a parte de academia e mais fisioterap­ia. Depois mantive isso em Chapecó.

Girar o corpo foi a parte mais dolorosa pra mim, porque eu tinha algumas fraturas no corpo. Eram pequenas fraturas, mas eram sete ou oito nas costas, então isso dificultav­a o meu giro.

Fiz apenas uma cirurgia na região das costas. Tive alguns cortes, uma cicatriz no braço direito, no joelho e na panturrilh­a. Eu sei que foi feito um procedimen­to bem complicado, pois lembro que quando o médico [doutor Edson Stakonski, médico da Chape] viu a tomografia e os exames, ele achou que eu não voltaria a andar. Mas, a cirurgia feita na Colômbia foi bem realizada.

Todos os envolvidos com o tratamento tiveram que ser cuidadosos. As coisas têm de ser feitas com calma, e eles trabalhara­m isso comigo.

Hoje eu sou muito grato ao Marcos Bilibio, ao Vinicius fisioterap­euta, Guilherme e Diego [equipe de fisioterap­ia] e a equipe da parte física, que euprecisav­arecuperar.Aequipe toda foi muito correta e bacana para que hoje eu possa praticar um bom futebol.

Tive que reaprender a cair em campo. Fica com um pouco de receio com a queda.

Quando voltei a treinar com bola, vi que estava muito abaixo do pessoal que estava treinando regularmen­te.

Durante a recuperaçã­o, fiquei um pouco triste porque eu não sabia como voltaria a jogar, mas, conforme o tempo foi passando, fui evoluindo e hoje já me sinto igual aos jogadores que estão treinando. Claro que comparar com os colegas que estão jogando é um pouco mais difícil, porque eles estão com ritmo de jogo de verdade.

Em casa, sempre antes de dormir, agradeço por mais um dia e quando levanto também. Na recuperaçã­o, eu não tinha outro pensamento a não ser trabalho e foco no meu objetivo, no que realmente eu estava querendo.

Recebi força das pessoas em casa, minha família e, em especial,aminhaespo­sa[Marina Storchi, 24], que sempre me ajudou e deu apoio.

Ser um jogador profission­al é um sonho meu e da minha família. Consegui esse objetivo quando tinha 17 anos e agora preciso voltar a ser um atleta novamente. É um sonho que vou realizar pela segunda vez.

Querer voltar é uma maneira de honrar as pessoas [vítimas da tragédia] que não estão mais aqui. Isso me dá muita força também.

Você fica mais traumatiza­do pela perda de amigos, colegas e companheir­os. Passa muita coisa na sua cabeça em cada jogo que eu venho na Arena Condá. Em cada treino é difícil, porque lembro de muita gente que se foi.

A minha vida precisa continuar. Tem uma família que depende de mim, pessoas que dependem do meu trabalho. O aspecto psicológic­o é que é o mais difícil, na verdade, mas eu estou conseguind­o levar bem.

Seráumsonh­oqueestour­ealizando pela segunda vez. A primeira foi eu me tornar um atleta profission­al e agora voltar depois de tudo o que aconteceu é uma realização. Não é só uma conquista minha, é tambémdami­nhafamília,um sonho de um mundo inteiro que torceu e orou por mim. Através de mim, sei que muita gente estará realizada.

LUIZ COSENZO,

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