Governo busca balcão único para negociar com empresas sob suspeita
Órgãos de controle articulam mudanças para encerrar conflitos de competência entre instituições
Participação do Ministério Público depende de garantias de compartilhamento de informação sigilosa
Órgãos de controle do governo federal se articulam para criar um balcão único para negociação de acordos de leniência com empresas sob suspeita, numa tentativa de pôr fim a conflitos de competência que desestimulam as empresas a colaborar com investigações como as conduzidas pela Operação Lava Jato.
Acordos de leniência são como delações feitas por empresas, em geral depois que seus executivos fecham acordos para colaborar com investigações em troca da promessa de redução de suas penas.
Para as empresas, o principal benefício alcançado com os acordos é a possibilidade de voltar a contratar com o poder público e receber crédito de bancos oficiais.
Já fazem parte do balcão único o Ministério da Transparência e Corregedoria-Geral da União, a Advocacia-Geral da União (AGU) e o Tribunal de Contas da União (TCU).
Devem entrar no grupo em agosto o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), o Banco Central (BC) e a CVM (Comissão de Valores Mobiliários), assim que o Congresso aprovar as normas para acordos de leniência com instituições financeiras.
Omodelopropostopelogoverno deve ser alterado para garantir a participação do Ministério Público Federal e do Cade nesses casos também.
AentradadoMinistérioPúblico depende de garantias de que haverá compartilhamento de informações sigilosas, segundo os procuradores da força-tarefa da Lava Jato.
Para eles, em casos que envolvem políticos e funcionários de outros Poderes, muitas vezes é difícil afastar interesses políticos da negociação dos acordos de leniência.
No passado, um projeto de lei que propunha coordenação entre os vários órgãos não prosperou. Desta vez, os envolvidos acham que as chances de acordo são maiores porque várias frentes de investigação da Lava Jato parecem perto da consolidação. PÉRIPLO Muitasempresassesentem inseguras em fechar acordos dessa natureza porque, dependendo das infrações cometidas, precisam negociar emmaisdeumguichê.“Qualquer um dos órgãos pode inviabilizar um acordo firmado pelo outro por suas competências constitucionais legais”, diz o ministro da Transparência, Wagner Rosário.
Uma empresa participante de cartel poderá procurar o Cade para uma leniência. No entanto, se também fraudou licitaçõessuperfaturandopreços, poderá sofrer sanções da Transparência e do TCU.
Pegas na Lava Jato, as empreiteiras Odebrecht, Camargo Corrêa e Andrade Gutierrez fizeram acordos de leniência com os procuradores e aceitaram pagar cerca de R$ 5,5 bilhões em multas e reparações, segundo as empresas.
No entanto, em março deste ano foram condenadas pelo TCU com outras empresas por fraude à licitação e superfaturamento na construção da usina de Angra 3, no Rio.
Por determinação do TCU, terão de renegociar seus acordos com o Ministério Público paraincluircláusulaspreven-
As opções para empresas e criminosos que aceitam colaborar com as autoridades
do o pagamento integral de danos causados e a entrega de provas para ajudar auditorias do tribunal. Caso contrário, poderão ser declaradas inidôneas, o que, na prática, invalidaria a leniência.
Diferentemente das três construtoras, a UTC, que também participou de Angra 3, foi declarada inidônea pelo TCU porque não tinha fechado a leniência. A situação embolou em julho, quando a empreiteira assinou um acordo com a Transparência e a AGU. Agora falta o TCU analisá-lo. DESCONFIANÇA As negociações não tiram das instituições suas competências legais para declarar as empresas inidôneas com base em diferentes leis —que divergem até na vigência da punição—, mas a ideia é que haja um acordo de cavalheiros para que eventuais decisões não sejam invalidadas. “A atuação conjunta é a solução para isso, o balcão único”, disse o ministro Rosário.
Para o ministro do TCU Augusto Nardes, um dos representantes do tribunal nas conversas com o governo, a crise econômica reforça a necessidade da cooperação. “Com o desemprego, precisamos garantir que essas empresas sobrevivam”, afirmou.
A ministra da AGU, Grace Mendonça, disse considerar que a leniência é uma política de Estado e, por isso, “não deve valer a premissa da desconfiança”. “As instituições são colegiadas”, afirmou.
“A atuação coordenada das diferentes instituições trará maior segurança jurídica para os acordos de leniência”, disse Alexandre Barreto, presidente do Cade.