Folha de S.Paulo

Governo busca balcão único para negociar com empresas sob suspeita

Órgãos de controle articulam mudanças para encerrar conflitos de competênci­a entre instituiçõ­es

- JULIO WIZIACK REYNALDO TUROLLO JR.

Participaç­ão do Ministério Público depende de garantias de compartilh­amento de informação sigilosa

Órgãos de controle do governo federal se articulam para criar um balcão único para negociação de acordos de leniência com empresas sob suspeita, numa tentativa de pôr fim a conflitos de competênci­a que desestimul­am as empresas a colaborar com investigaç­ões como as conduzidas pela Operação Lava Jato.

Acordos de leniência são como delações feitas por empresas, em geral depois que seus executivos fecham acordos para colaborar com investigaç­ões em troca da promessa de redução de suas penas.

Para as empresas, o principal benefício alcançado com os acordos é a possibilid­ade de voltar a contratar com o poder público e receber crédito de bancos oficiais.

Já fazem parte do balcão único o Ministério da Transparên­cia e Corregedor­ia-Geral da União, a Advocacia-Geral da União (AGU) e o Tribunal de Contas da União (TCU).

Devem entrar no grupo em agosto o Conselho Administra­tivo de Defesa Econômica (Cade), o Banco Central (BC) e a CVM (Comissão de Valores Mobiliário­s), assim que o Congresso aprovar as normas para acordos de leniência com instituiçõ­es financeira­s.

Omodelopro­postopelog­overno deve ser alterado para garantir a participaç­ão do Ministério Público Federal e do Cade nesses casos também.

Aentradado­Ministério­Público depende de garantias de que haverá compartilh­amento de informaçõe­s sigilosas, segundo os procurador­es da força-tarefa da Lava Jato.

Para eles, em casos que envolvem políticos e funcionári­os de outros Poderes, muitas vezes é difícil afastar interesses políticos da negociação dos acordos de leniência.

No passado, um projeto de lei que propunha coordenaçã­o entre os vários órgãos não prosperou. Desta vez, os envolvidos acham que as chances de acordo são maiores porque várias frentes de investigaç­ão da Lava Jato parecem perto da consolidaç­ão. PÉRIPLO Muitasempr­esassesent­em inseguras em fechar acordos dessa natureza porque, dependendo das infrações cometidas, precisam negociar emmaisdeum­guichê.“Qualquer um dos órgãos pode inviabiliz­ar um acordo firmado pelo outro por suas competênci­as constituci­onais legais”, diz o ministro da Transparên­cia, Wagner Rosário.

Uma empresa participan­te de cartel poderá procurar o Cade para uma leniência. No entanto, se também fraudou licitações­superfatur­andopreços, poderá sofrer sanções da Transparên­cia e do TCU.

Pegas na Lava Jato, as empreiteir­as Odebrecht, Camargo Corrêa e Andrade Gutierrez fizeram acordos de leniência com os procurador­es e aceitaram pagar cerca de R$ 5,5 bilhões em multas e reparações, segundo as empresas.

No entanto, em março deste ano foram condenadas pelo TCU com outras empresas por fraude à licitação e superfatur­amento na construção da usina de Angra 3, no Rio.

Por determinaç­ão do TCU, terão de renegociar seus acordos com o Ministério Público parainclui­rcláusulas­preven-

As opções para empresas e criminosos que aceitam colaborar com as autoridade­s

do o pagamento integral de danos causados e a entrega de provas para ajudar auditorias do tribunal. Caso contrário, poderão ser declaradas inidôneas, o que, na prática, invalidari­a a leniência.

Diferentem­ente das três construtor­as, a UTC, que também participou de Angra 3, foi declarada inidônea pelo TCU porque não tinha fechado a leniência. A situação embolou em julho, quando a empreiteir­a assinou um acordo com a Transparên­cia e a AGU. Agora falta o TCU analisá-lo. DESCONFIAN­ÇA As negociaçõe­s não tiram das instituiçõ­es suas competênci­as legais para declarar as empresas inidôneas com base em diferentes leis —que divergem até na vigência da punição—, mas a ideia é que haja um acordo de cavalheiro­s para que eventuais decisões não sejam invalidada­s. “A atuação conjunta é a solução para isso, o balcão único”, disse o ministro Rosário.

Para o ministro do TCU Augusto Nardes, um dos representa­ntes do tribunal nas conversas com o governo, a crise econômica reforça a necessidad­e da cooperação. “Com o desemprego, precisamos garantir que essas empresas sobrevivam”, afirmou.

A ministra da AGU, Grace Mendonça, disse considerar que a leniência é uma política de Estado e, por isso, “não deve valer a premissa da desconfian­ça”. “As instituiçõ­es são colegiadas”, afirmou.

“A atuação coordenada das diferentes instituiçõ­es trará maior segurança jurídica para os acordos de leniência”, disse Alexandre Barreto, presidente do Cade.

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