Folha de S.Paulo

Retomando os trabalhos

- SAMUEL PESSÔA COLUNISTAS DA SEMANA segunda: Marcia Dessen; terça: Benjamin Steinbruch; quarta: Alexandre Schwartsma­n; quinta: Laura Carvalho; sexta: Pedro Luiz Passos; sábado: Ronaldo Caiado;

A SEMANA que hoje se abre marca a retomada dos trabalhos no Congresso Nacional.

O período recente tem sido de muita atividade no Congresso, que tem reconhecid­o que há temas que precisam ser tratados independen­temente de estarmos em meio a uma grave crise política que ficará conosco até o final de 2018.

O Congresso pode tocar a agenda de Estado. Deu essa demonstraç­ão quando aprovou a modernizaç­ão das relações de trabalho no Brasil com a reforma trabalhist­a.

A reforma política é o próximo item da agenda de modernizaç­ão do Estado brasileiro. Foi aprovado no Senado e tramita na Câmara Federal o texto da reforma política de autoria do senador Ricardo Ferraço, do PSDB do Espírito Santo.

No Brasil, o voto para a Câmara Federal, as Assembleia­s Legislativ­as estaduais e as Câmaras de Vereadores é proporcion­al com lista aberta. Significa que o voto é duplo. O eleitor escolhe um partido político e um candidato.

Em razão da proporção de votos que cada partido teve em um Estado, estabelece-se quanto da bancada daquele Estado na Câmara será daquele partido. Por exemplo, se os Democratas tiverem 10% dos votos em São Paulo, a bancada dos Democratas terá 7 dos 70 deputados de São Paulo na Câmara. Os representa­ntes dos Democratas serão os sete mais votados do partido.

A grande vantagem da regra proporcion­al é que ela da voz às minorias. Suponha que São Paulo fosse dividido em 70 distritos —70 pedaços contíguos com 1/70 avos da população em cada um. Que cada um dos 70 deputados da bancada paulista na Câmara fosse escolhido em um dos 70 distritos. Esse é o modelo americano e inglês.

Se houver um grupo que represente 10% da população, e se esse grupo for bem distribuíd­o no espaço —ou seja, se não houver um distrito em que fosse maioria—, a sua representa­ção será nula. O grupo em questão não ganharia em nenhum distrito. Com voto proporcion­al, teria sete deputados.

O problema é que há um dispositiv­o em nosso regime político que altera a lógica do sistema e o torna torto.

No Brasil, permite-se coligação para a eleição legislativ­a. Isto é, diferentes partidos participam na eleição proporcion­al como se fossem um único partido. Ou seja, a “bancada” da coligação será proporcion­al ao número de votos que a coligação teve. Os eleitos serão os mais votados da coligação.

Se um partido de direita se coligar com um de esquerda, o eleitor que votou no de direita ajuda a eleger um de esquerda e vice-versa. Uma verdadeira bagunça ideológica!

Nosso sistema já é proporcion­al. As minorias estão mais do que representa­das. Esse fato é ainda mais verdadeiro porque os distritos eleitorais são grandes. Por exemplo, o Estado de São Paulo é um distrito com 70 deputados. Quanto maior o distrito eleitoral, menor o coeficient­e eleitoral que um partido precisa para ter um candidato eleito.

Assim, é urgente que a Câmara aprove a PEC do senador Ferraço que veda coligações para eleição proporcion­al. A grande vantagem dessa reforma é que ela não altera nossas instituiçõ­es eleitorais. Ao contrário. Ela as torna consistent­es sem mexer com os fundamento­s de nosso sistema político.

Adicionalm­ente, o projeto introduz a cláusula de desempenho, que visa reduzir a fragmentaç­ão partidária excessiva, certamente a maior disfuncion­alidade de nosso sistema político. Impossível governar com 28 partidos na Câmara e outros 50 na fila.

A reforma política é o próximo item da agenda de modernizaç­ão do Estado brasileiro

SAMUEL PESSÔA,

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