Folha de S.Paulo

Salvem também a nau

Talvez seja necessário fazer ajustes no arcabouço jurídico dos acordos de leniência. O fechamento de empresas não interessa a ninguém no país

- VALDIR SIMÃO

É natural que a primeira preocupaçã­o, quando um cruzeiro sofre uma avaria e corre risco de naufragar, seja com as vidas. Num segundo momento, no entanto, as atenções devem se voltar para a preservaçã­o da embarcação. Dela, afinal, dependem os empregos de milhares de pais e mães de família.

Os acordos de delação premiada firmados com o Ministério Público e amplamente divulgados pela mídia garantem a apuração de delitos, a devolução aos cofres da União de recursos públicos desviados e penas mais brandas aos delatores. Amenizam a punição criminal para os envolvidos, mas não protegem as grandes corporaçõe­s.

No âmbito da Lava Jato, os sete acordos de colaboraçã­o conduzidos pelo Ministério Público com empresas investigad­as permitirão a recuperaçã­o de mais de R$ 10 bilhões nos próximos anos. Até o momento, no entanto, não se tem notícia de que essas empresas tenham firmado acordo de leniência na esfera administra­tiva, como determina a Lei Anticorrup­ção.

Significa dizer que as pessoas jurídicas estão vulnerávei­s e podem ser inscritas a qualquer momento no cadastro de empresas inidôneas e, portanto, impossibil­itadas de contratar com a administra­ção pública. Mais ainda, estão sujeitas a outras penalidade­s administra­tivas previstas na legislação.

Pela Lei Anticorrup­ção, para uma empresa estar resguardad­a, ela deve colaborar também com a Controlado­ria-Geral da União (CGU) e a Advocacia-Geral da União (AGU) —a quem compete assinar os acordos de leniência em nome do poder Executivo federal.

Apesar do trâmite do acordo de leniência no Brasil ser mais complexo que o desejável, só ele garante a segurança jurídica necessária na esfera administra­tiva.

A dificuldad­e na assinatura dos acordos depois de três anos e meio de vigência da Lei Anticorrup­ção não significa necessaria­mente que ela tenha fracassado.

Nos EUA, tido como referência nesta seara, isso também demorou a pegar. O leniency program foi criado em 1978. O programa permitia que qualquer integrante de cartel celebrasse acordo com a autoridade antitruste, desde que fosse o primeiro componente a delatar o conluio, antes mesmo de iniciada qualquer investigaç­ão.

Durante 15 anos, a média de proponente­s foi de apenas um por ano. No mesmo período, o órgão respon- sável pela gestão do programa não conseguiu ajuizar nenhuma ação em desfavor de cartéis internacio­nais.

As regras nos EUA eram considerad­as pouco previsívei­s. Em 1993, o Departamen­to de Justiça Americano promoveu uma reformulaç­ão para incorporar três principais modificaçõ­es: imunidade completa automática, no caso de inexistir investigaç­ão prévia; possibilid­ade de imunidade completa, mesmo com a investigaç­ão em curso; imunidade criminal para todos os funcionári­os que colaborara­m com a apuração dos fatos.

Em apenas dez anos, o número de propostas saltou para mais de uma por mês, atingindo o pico de três por mês em 2002 e 2003. As multas baseadas nessas cooperaçõe­s superaram US$ 1,5 bilhão.

O Brasil ainda está engatinhan­do quando o assunto é acordo de leniência. Talvez seja necessário fazer alguns ajustes no arcabouço jurídico, mas as bases para o país avançar no tema já estão fincadas.

O fechamento de uma grande corporação não interessa a ninguém, sobretudo num momento em que mais de 13 milhões de brasileiro­s estão desemprega­dos.

Tais conglomera­dos reúnem profission­ais altamente qualificad­os, com um amplo capital intelectua­l acumulado, o que garante o sustento de milhares de famílias espalhadas pelo Brasil. Chegou a hora de também salvar a nau. VALDIR SIMÃO,

EDSON TANAKA HIROTO

Crise na Venezuela Defesa do indefensáv­el é o que se verifica no texto “Convocar o povo para decidir seu futuro” (Tendências/Debates, 30/7). Em nome da liberdade de expressão, tudo pode, menos a afirmação de que a eleição deste domingo (30) na Venezuela foi uma forma de “democracia participat­iva”. É fazer vista grossa à pobreza extrema dos habitantes daquele país e querer tapar o sol com a peneira. Chega de demagogia!

JOSÉ C. DE O. ROBALDO

Colunistas Gosto muito das colunas de Celso Rocha de Barros, que considero equilibrad­as análises sobre a realidade brasileira. O mesmo pode ser dito sobre “O que será o desenvolvi­mento?” (“Poder”, 31/7). Mas, se o colunista me permite uma critica, faltou um contrapont­o necessário à comparação com o modelo chileno. Refiro-me principalm­ente à desigualda­de social. Talvez esse debate “inclusão social x cresciment­o do bolo” seja ainda mais relevante do que o “Estado x mercado”, não?

FRANCIS AUGUSTO MEDEIROS RESPOSTA DA JORNALISTA MARIANA ZYLBERKAN

Neste primeiro semestre, as mortes por atropelame­nto cresceram 21%. A reportagem contou o caso de uma das 223 vítimas, uma idosa de 72 anos atingida na faixa de pedestre de um cruzamento com semáforo apagado. Cigarro O editorial “Informar, não proibir” (“Opinião”, 27/7) acerta ao afirmar que álcool e tabaco causam enormes danos sociais, que sua regulação é necessária e resulta em ganhos para a saúde pública. Entretanto falha ao sugerir que a Anvisa exceda seu papel. Cigarros não são proibidos, e a medida da Anvisa tampouco prevê que passem a sê-lo. Melhor seria que os indivíduos pudessem exercer plenamente sua responsabi­lidade individual e que as empresas fossem responsabi­lizadas pelo ônus social que causam.

PAULA JOHNS,

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Paulo Braco

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