Folha de S.Paulo

Gastos opacos

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Uma das despesas públicas que mais cresceram nos últimos anos não constou dos Orçamentos examinados pelo Congresso Nacional.

Trata-se dos subsídios, muitas vezes concedidos a grandes empresas, implícitos em financiame­ntos oficiais concedidos a juros inferiores aos de mercado.

Só agora, em razão da dramática situação das contas do Tesouro Nacional, o tema tem sido tratado com mais cuidado e transparên­cia pelo governo. Estudo recente da Fazenda aponta que tais dispêndios saltaram de R$ 22,8 bilhões, em 2010, para R$ 78,3 bilhões no ano passado, em valores corrigidos.

Os contribuin­tes, mesmo os que se dispõem a acompanhar de perto as ações do governo, não sabem que arcam com custos tão altos —em 2016, quase o triplo do valor destinado ao Bolsa Família— e muito menos o destino do dinheiro.

As cifras, afinal, não são listadas entre os desembolso­s dos ministério­s ou da Presidênci­a.

A conta, porém, não é por isso menos real: quando o Tesouro toma recursos aos juros escorchant­es do país e empresta em condições favorecida­s, o prejuízo se incorpora à dívida pública —configuran­do, pois, um gasto.

Parte expressiva da escalada dos subsídios opacos está associada ao BNDES, cujos financiame­ntos se baseiam em uma taxa, a TJLP, fixada de modo arbitrário pelo governo em patamares inferiores aos dos títulos da dívida federal.

No ano passado, por exemplo, a TJLP foi mantida em 7,5% ao ano, enquanto os juros do Banco Central chegaram a 14,15%.

Sob forte resistênci­a de setores empresaria­is e de políticos de pensamento­intervenci­onista,umamedida provisória busca corrigir de forma gradual essa distorção. Pretende-se que a taxa do BNDES, a ser rebatizada de TLP, alinhe-se ao longo de cinco anos à remuneraçã­o dos papéis da dívida do Tesouro.

Argumentam os críticos da MP que a alteração encarecerá o crédito de longo prazo e afetará a competitiv­idade das empresas. O país, por esse raciocínio, estaria abdicando da prerrogati­va de realizar política industrial e de fomento.

São afirmações, no mínimo, questionáv­eis. A proposta não proíbe subsídios; estes, no entanto, devem ser concedidos diretament­e pelo Tesouro Nacional, com dinheiro da arrecadaçã­o de impostos e nas dimensões explicitad­as pela lei orçamentár­ia.

E os juros brasileiro­s precisam cair, decerto, a patamares civilizado­s —para todos, não apenas aos que têm acesso ao banco oficial.

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