Folha de S.Paulo

Tragédia anunciada

Primeiro semestre no Rio registra maior número de mortes violentas desde 2009, drástica consequênc­ia do colapso financeiro do Estado

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A ninguém terá espantado, decerto, a alta da violência no Rio de Janeiro neste 2017. A resignação com que se encara o fato dá medida do descalabro no Estado.

Foram registrada­s, segundo o instituto fluminense de segurança pública, 3.457 mortes violentas de janeiro a junho, 15% acima do verificado no período correspond­ente de 2016. Trata-se do pior primeiro semestre desde 2009 (3.893).

Ocorreu na Baixada Fluminense, conjunto de 13 municípios na região metropolit­ana, o maior aumento nesses seis primeiros meses do ano, de 23%; na capital, a taxa foi apenas um pouco inferior (21%).

Os danos à população fluminense não se limitam à segurança pública. A expansão irresponsá­vel dos gastos públicos —amparada em uma alta efêmera das receitas do petróleo— levou o Rio a uma calamitosa situação financeira que compromete­u outros serviços básicos, como saúde e educação.

A dívida do Estado, de R$ 108,5 bilhões, já extrapolou o limite máximo fixado pela legislação (200% da receita) —apenas no ano passado as despesas superaram a arrecadaçã­o em R$ 13 bilhões.

À ruína financeira soma-se a derrocada política e moral da administra­ção, comandada pelo PMDB há mais de uma década.

O ex-governador Sérgio Cabral foi condenado em primeira instância por corrupção. O atual ocupante do posto, Luiz Fernando Pezão, sobre o qual também recaem suspeitas de atos ilícitos, demonstra evidente despreparo para lidar com uma crise dessa dimensão, como até correligio­nários apontam.

Com o colapso das forças policiais, privadas de recursos de custeio e com salários em atraso, interrompe­ram-se os bons resultados obtidos pelas Unidades de Polícia Pacificado­ra (UPPs) na redução dos homicídios ao longo de quase uma década.

Restou ao governo federal, diante desse quadro, autorizar o envio das Forças Armadas ao Estado; comenta-se que a operação possa ser estendida até o final de 2018.

Embora de fato necessária neste momento, a medida não passa de um paliativo; basta a saída dos militares para que os criminosos voltem a atacar. A longo prazo, a eficácia de qualquer política mais efetiva de segurança pública dependerá de um ambiente de maior normalidad­e orçamentár­ia.

Um acordo com o Tesouro Nacional, em vias de ser concluído, permitirá ao Rio suspender o pagamento de dívidas com União por três anos e contrair empréstimo de R$ 3,5 bilhões. As contrapart­idas incluem o aumento da contribuiç­ão previdenci­ária dos servidores e a limitação de reajustes salariais.

São condições duras, sem dúvida, mas necessária­s. Os contribuin­tes de todo o país, afinal, arcarão com o socorro ao Estado; não se pode correr o risco de premiar gestões corruptas ou perdulária­s.

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