Folha de S.Paulo

Cidade se torna símbolo da crise de violência no México

- AZAM AHMED

Tecomán, outrora numa das áreas mais seguras do país, passou a ser, em 2016, a cidade com a maior taxa de homicídio, que deve dobrar neste ano

Israel Cisneros, 20, morreu na casa de um cômodo de seu pai. Quando a polícia chegou à cena do crime, o segundo homicídio naquela tarde, o sangue que escorria do ferimento de bala em seu olho tinha começado a secar e rachar.

Tecomán era uma das partes mais seguras do México, um lugar onde as pessoas que fugiam da guerra entre o Estado e o narcotráfi­co iam buscar refúgio.

Agora, as autoridade­s dessa cidade agrícola no Estado litorâneo de Colima mal se importam quando dois assas- Tecomán sinatos ocorrem em um intervalo de poucas horas. Isso não é mais tão raro.

Em 2016, a cidade se tornou o município mais mortífero do México, com um índice de 102,4 homicídios para cada 100 mil habitantes, semelhante ao de uma zona de guerra. Neste ano, o número está a caminho de dobrar, tornando a cidade o exemplo gritante de uma crise nacional.

Mesmo após mais de 100 mil mortes, 30 mil desapareci­dos e bilhões de dólares jogados na fornalha da luta de décadas do país contra o crime organizado, as chamas não recuaram. Segundo certas métricas, elas estão piorando.

Os últimos meses definiram recordes especialme­nte terríveis: mais cenas de homicídios surgiram em todo o México do que em qualquer ponto desde que o país começou a registrá-las, há 20 anos.

Algumas delas tinham só uma vítima. Outras possuíam várias. Mas sua frequência crescente aponta para um aumento alarmante da violência entre os cartéis em guerra.

Grupos criminosos estão varrendo partes do México que costumavam ser seguras, criando uma enxurrada de mortes que, segundo algumas contagens, superam a carnificin­a ocorrida no auge da guerra às drogas, em 2011.

“O que está acontecend­o aqui acontece no país todo”, disse José Guadalupe García Negrete, prefeito de Tecomán. “É como um câncer.”

Para o presidente Enrique Peña Nieto, o fenômeno é um desafio fundamenta­l à sua narrativa orientador­a: que o México está avançando muito além das amarras da violência e da inseguranç­a.

“O governo Peña Nieto subestimou seriamente, ou não compreende­u, a natureza do problema que o México está passando”, disse David Shirk, professor na Universida­de de San Diego (EUA).

O aumento dos homicídios vem de muitas forças, diz ele: a fraqueza da polícia local e estadual, a fragmentaç­ão dos grupos criminosos depois que seus líderes foram presos, a maior demanda por drogas nos EUA e o fluxo de dinheiro e armas que o tráfico envia de volta ao México.

Diante do aumento de homicídios, as autoridade­s apresentar­am um novo culpado: as reformas legais implementa­das por seus antecessor­es.

O novo sistema inibe detenções arbitrária­s. Os suspeitos detidos sem provas foram libertados, levando a um coro de autoridade­s que afirmam que o novo sistema é responsáve­l pelo surto de crime e impunidade.

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