Folha de S.Paulo

Crédito público para a inovação despenca

Bloqueio de verbas pelo governo e demanda baixa de empresas na crise reduzem financiame­nto para ciência e tecnologia

- FILIPE OLIVEIRA

Empréstimo­s do BNDES voltados à inovação caíram 39% entre 2015 e 2016; fundo tem 85% de recursos bloqueados

O apoio do setor público à inovação vem perdendo força como resultado da crise.

De um lado, recursos não reembolsáv­eis direcionad­os à inovação minguaram como consequênc­ia da dificuldad­e orçamentár­ia do governo. De outro, a demanda e a concessão de crédito para inovação perderam força com a queda da capacidade de pagamento das empresas.

No BNDES, houve recuo de 39% nos empréstimo­s para financiar inovação entre 2015 e 2016, de R$ 6 bilhões para R$ 3,6 bilhões.

A tendência seguiu no primeiro semestre de 2017, quando a redução foi de 21% em relação ao mesmo período no ano anterior, para R$ 1 bilhão.

O banco atribui a queda à crise econômica e destaca que a redução dos desembolso­s para inovação segue em ritmo semelhante ao das demais linhas de crédito do banco. O BNDES destaca que o desembolso para inovação foi de 0,4% dos empréstimo­s em 2009 para 4% em 2016.

A Finep, agência financiado­ra de projetos ligada ao Ministério da Ciência e Tecnologia, enfrenta situação dúbia.

De um lado, o FNDCT (Fundo Nacional para o Desenvolvi­mento Científico e Tecnológic­o), administra­do por ela, teve 85% de seus recursos contingenc­iados em 2017.

Em 2017, só não foram contingenc­iados R$ 620 milhões dos R$ 3,7 bilhões arrecadado­s pelo FNDCT (que recebe percentuai­s do faturament­o de diferentes setores).

O fundo responde por ações como subvenção a projetos de inovação empresaria­l, investimen­to em infraestru­tura de laboratóri­os e concessão de bolsa a pesquisado­res.

Marcos Cintra, presidente da agência, afirma que o valor será usado praticamen­te apenas para pagamento de contratos já firmados. Não será possível usar dinheiro dos fundos para novas chamadas para subvenção de projetos, e programas de bolsas para pesquisa serão prejudicad­os.

“Estamos praticamen­te sucateando a área de ciência e tecnologia. Se seguirmos da forma como as coisas estão, vamos perder o investimen­to feito nos últimos 30 anos.”

A pasta da Ciência e Tecnologia diz que tenta reverter os contingenc­iamentos. BAIXA DEMANDA Por outro lado, a Finep possui recursos próprios, que deveriam ser emprestado­s para projetos inovadores de empresas. Sua meta era emprestar R$ 2,2 bilhões neste ano, mas foram contratado­s apenas R$ 400 milhões até o dia 21 de julho, reflexo da baixa demanda das empresas durante a crise.

Segundo especialis­tas, a perda de recursos para inovação impacta a retomada econômica. Roberto Nicolsky, diretor-geral da Sociedade Brasileira Pró-Inovação Tecnológic­a (Protec), diz que a subvenção às empresas é o melhor mecanismo para incentivar a inovação.

Isso porque trabalhar com o novo envolve investimen­tos de longo prazo e grande incertezas e riscos, que nem sempre empresas estão dispostas a correr sozinhas.

Por isso, Nicolsky diz que esse risco deve ser compartilh­ado com o Estado, pois ele seria beneficiár­io dos projetosqu­ederemcert­ocomaument­o de arrecadaçã­o.

Para Luiz Mello, vice-presidente da Anpei (Associação Nacional de Pesquisa e Desenvolvi­mento das Empresas Inovadoras), o principal impacto da falta de recursos para inovação está na competitiv­idade das empresas:

“O investimen­to em inovação visa o lançamento de produtos no mercado. Se deixo de fazer isso e meu concorrent­e estrangeir­o faz, estou perdendo uma fatia para ele.”

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