Folha de S.Paulo

A bola entrou?

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O futebol não costuma acabar no apito final. Continua nos comentário­s da rua, do botequim, do rádio, da televisão, nas gozações do dia seguinte no trabalho. Até o próximo jogo. Essa cultura, hoje, transferiu-se para as redes sociais, quase sempre de forma violenta e covarde. A corneta grita espumando de raiva.

Depois de ter sido acusado de repassar a informação que resultou na anulação de um pênalti na partida entre Santos e Flamengo, o jornalista Eric Faria sofreu até ameaças de morte. Devido ao mesmo lance do mesmo jogo, o árbitro, como de praxe, teve a honra da senhora mãe dele posta em dúvida —não só no estádio, sobretudo na internet— por um erro que não cometeu.

Essa e outras confusões estão ligadas à “interferên­cia externa”, ou seja, quando o juiz toma uma decisão baseada em informaçõe­s de fora, de alguém que não pertença ao quadro de arbitragem, um cartola, um repórter, um gandula, um maqueiro, um torcedor com acesso ao campo. Se isso acontecer, a partida pode ser anulada. Mesmo o replay do lance no telão do estádio está proibido.

Acontece que tal interferên­cia, paradoxalm­ente, vai virar regra. Na próxima Copa do Mundo, na Rússia, teremos a figura do árbitro de vídeo. O recurso tecnológic­o tem por objetivo dirimir as dúvidas e será usado em casos de expulsão, pênalti e gol (se a bola entrou ou não, afinal). Louvável. Mas, no primeiro grande teste, já deu polêmica. Num jogo do Mundial de Clubes, foi marcado um pênalti que não foi pênalti. Para complicar, o jogador estava impedido —numa “banheira” digna do Mário Vianna.

Corre-se o risco de a tecnologia aumentar a confusão, e o jogo ficar ainda mais feio e truncado. Futebol nem sempre é justiça: valerá a pena prescindir das dúvidas e dos erros? O pessoal vai continuar do mesmo jeito xingando a mãe no Twitter. NABIL BONDUKI

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