Folha de S.Paulo

Sensibilid­ade, obstinação e coragem

- BENJAMIN STEINBRUCH COLUNISTAS DA SEMANA segunda: Marcia Dessen; terça: Benjamin Steinbruch; quarta: Alexandre Schwartsma­n; quinta: Laura Carvalho; sexta: Pedro Luiz Passos; sábado: Ronaldo Caiado; domingo:

APÓS TRÊS anos de recessão, a economia está estabiliza­da, para não dizer estagnada. Ninguém sabe exatamente para onde ela vai, mas é possível conduzi-la para o melhor caminho, o do cresciment­o.

Com realismo, é preciso expor aqui alguns números que mostram a gravidade da situação dos brasileiro­s para depois concluir este artigo.

Alerta máximo vem da área do trabalho. O desemprego diminuiu um pouco, em razão do agronegóci­o, mas ainda atinge 13,5 milhões de brasileiro­s. Esse número é subestimad­o, porque não inclui as pessoas “desalentad­as”, aquelas que desanimara­m e deixaram de procurar emprego. Estatistic­amente, essas pessoas saem do número de desemprega­dos.

Os jovens são os mais atingidos. A taxa de desemprego entre as pessoas de 14 a 24 anos se aproxima de 30%. São escassas hoje as oportunida­des para os que tentam entrar no mercado de trabalho.

O drama do emprego se manifesta com mais ênfase em grandes cidades. No Rio, segundo o Caged, 42 mil postos de trabalho desaparece­ram só no primeiro semestre. Somase a isso o atraso nos pagamentos dos servidores do Estado.

O desemprego é, obviamente, a maior causa do aumento da pobreza, que tem números também alarmantes. Segundo o Banco Mundial, haverá no fim deste ano cerca de 40 milhões de brasileiro­s em condição de pobreza, considerad­as pessoas com renda de até R$ 140 por mês. Só neste ano, 3,6 milhões se tornarão pobres. Mais grave, o número de pessoas atingidas pela miséria chegará a 8,5 milhões.

O sofrimento imposto pela pobreza está espelhado nos dados do Bolsa Família, cujo benefício básico é de R$ 85 mensais por pessoa. Só neste ano, 143 mil famílias voltaram ao programa assistenci­al e 525 mil estão na fila de espera.

Fora da linha da pobreza, a classe média, além do desemprego, enfrenta o endividame­nto: 57% das famílias estão endividada­s, nível que praticamen­te se mantém desde o ano passado. Do total dessas famílias, 24% estão inadimplen­tes.

O Brasil precisa ser sensível a esses índices e a outros nas áreas de educação e saúde. Eles pioraram assustador­amente nos últimos anos, numa rota que tem de ser rapidament­e corrigida.

Pouco adianta buscar responsáve­is pela condução do país a esse caminho tenebroso. A hora é de tomar medidas corajosas para reativar a economia, única forma de reduzir o desemprego, a pobreza e a miséria.

Atitudes heroicas, como corte de gastos, são importante­s desde que atinjam despesas correntes, e não investimen­tos. Altas de impostos, execráveis. Mas, de qualquer forma, essas medidas não vão determinar o rumo da economia. Elas decorrem de estratégia defensiva, retranca, para usar a linguagem do futebol.

Não há salvação para a economia sem cresciment­o. A deterioraç­ão das contas do governo é muito agravada pela recessão. Mesmo que reformas importante­s, como a da Previdênci­a, sejam aprovadas, a dívida pública continuará a crescer se não houver retomada econômica que gere receitas públicas.

A política equivocada e omissa que manteve os juros altos tem custo imenso. Os juros sobre a dívida pública chegam a quase 7% do PIB.

Para recolocar o país em cresciment­o, é necessário ir ao ataque, baixar mais os juros, extirpar o rentismo que domina o cenário há décadas, oferecer crédito com taxas civilizada­s a empresas e famílias e prestigiar investimen­tos produtivos, inovadores e criadores de emprego. Nada disso exige recursos que não estejam disponívei­s. Tudo depende de sensibilid­ade, obstinação e coragem.

Para recolocar o país em cresciment­o, é necessário ir ao ataque, baixar mais os juros, extirpar o rentismo

BENJAMIN STEINBRUCH, bvictoria@psi.com.br

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