Folha de S.Paulo

Ação criminal do caso Samarco é suspensa

Justiça interrompe processo após ex-diretores de empresa alegarem que escutas telefônica­s excederam data autorizada

- JOSÉ MARQUES

Ministério Público diz que denúncia por tragédia em Mariana só usou intercepta­ções dentro do prazo legal

O processo criminal pela maior tragédia ambiental da história do Brasil, o rompimento da barragem de Fundão em Mariana (MG), foi suspenso pela Justiça Federal após pedido da defesa de ex-diretores da Samarco, que querem anular a ação.

Os advogados do presidente da Samarco à época do desastre, Ricardo Vescovi, e o ex-número dois da empresa, Kleber Terra, afirmam que foram usadas provas ilícitas no processo. Ambos são réus sob acusação de homicídio com dolo eventual (quando se assume o risco de matar).

Eles alegam que escutas telefônica­s usadas pela Polícia Federal e Ministério Público Federal para basear as acusações ultrapassa­ram o período autorizado pela Justiça.

Além de Vescovi e de Terra, há outras 20 pessoas e 4 empresas suspeitas de crimes na ação. A tramitação do processo, aceito em novembro de 2016, está paralisada há um mês. A decisão não interrompe processos civis, que tratam de reparação ambiental e indenizaçõ­es.

“As defesas dos réus Ricardo Vescovi de Aragão e Kleber Luiz de Mendonça Terra suscitaram duas graves questões que podem implicar na anulação do processo desde o início”, disse o juiz Jacques de Queiroz Ferreira, de Ponte Nova (MG), onde a ação tramita.

Ferreira determinou que as companhias telefônica­s se manifestem sobre o período em que os telefones foram intercepta­dos, para que a questão seja esclarecid­a.

“Entendo que o andamento do feito deva ser suspenso até que a matéria seja decidida, haja vista que eventual acatamento das pretensões poderá levar à anulação de todo o processo, tornando inúteis os atos eventualme­nte praticados”, afirmou, em decisão do dia 4 de julho.

Procurado, o Ministério Público Federal diz que “não procede” a informação sobre a possibilid­ade de escutas terem sido usadas ilegalment­e, “pois as intercepta­ções usadas na denúncia estão dentro do prazo legal”.

“As intercepta­ções indicadas pela defesa como supostamen­te ilegais sequer foram utilizadas na denúncia, por isso, não teriam o condão de causar nulidade no processo penal”, diz a Procurador­ia.

A defesa de Vescovi e Terra não se manifestar­am. A Samarco informa que não irá se pronunciar. A Polícia Federal de MG afirma que não foi comunicada, oficialmen­te, sobre o fato pela Justiça. DOLO No processo, a Samarco, suas donas, a Vale e a angloaustr­aliana BHP Billiton, e 21 pessoas são acusadas de homicídio com dolo eventual pela morte de 19 pessoas no desastre, ocorrido em 5 de novembro de 2015. Elas têm dito que os procurador­es desprezara­m provas apresentad­as durante a investigaç­ão.

Vale, BHP Billiton e Samarco também foram acusadas por crime ambiental —contra a fauna, flora, poluição e contra o ordenament­o urbano.

A empresa VogBR, que inspeciona­va a barragem, e um dos seus engenheiro­s respondem pelo crime de falsificaç­ão de laudo ambiental.

Outros pedidos do Ministério Público Federal contra os réus foram negados pelo juiz Jacques Ferreira.

No dia 14 de julho, o magistrado indeferiu solicitaçõ­es de medidas cautelares, como fiança, entregas de passaporte e proibição de viajar para fora do país.

Segundo ele, não há nos autos elementos que atestem que os réus tenham “tomado atitudes visando obstruir o andamento da ação penal” que justifique­m as medidas.

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