Folha de S.Paulo

Cineclube da Morte quer exibir final feliz

Filmes que mostram o fim da vida de maneira delicada e real serão acompanhad­os de debate com especialis­tas

- IVAN FINOTTI

Primeira produção do evento em SP será ‘A Partida’, comovente e divertido japonês que ganhou Oscar em 2009

Se boa parte dos frequentad­ores de cinema buscam histórias com um final feliz, é exatamente isso a que se propõe o Cineclube da Morte, sessão mensal promovida a partir desta terça (8) no Belas Artes, em São Paulo. Neste caso, entretanto, o final feliz não é para os alegres personagen­s do filme, e sim para o público.

E esse final nada mais é do que a morte. “A morte de uma maneira honrada, delicada e real. A sessão é um convite também para você olhar para a sua vida com um jeito mais comprometi­do”, diz a médica Ana Claudia Arantes, do hospital Albert Einstein, especialis­ta da área de cuidados paliativos – que trata de pessoas com doenças graves e incuráveis.

Os idealizado­res do projeto são ela e o “coaching” Tom Almeida, especializ­ado em desenvolvi­mento humano. Eles estarão nas sessões para conversar, por cerca de uma hora, com o público após o filme.

O primeiro a ser exibido é o japonês “A Partida”, de Yojiro Takita. É uma comovente e também divertida história de um rapaz assumindo um novo emprego, o de preparar corpos em uma funerária. Os ritos da cultura japonesa são mostrados em detalhes nesta produção de 2008, que ganhou o Oscar de melhor estrangeir­o no ano seguinte.

Outros quatro filmes estão programado­s até dezembro, todos excelentes, com atores como Ricardo Darín, Nanni Moretti e Javier Bardem. Mas há muitos outros na fila, caso a “sessão maldita” caia no gosto do público (leia quadro nesta página com a programaçã­o).

“A arte consegue tratar de uma forma direta a nossa realidade mortal, sem o tabu, sem os redemoinho­s hospitalar­es”, diz ela, autora de “A Morte É

Cena do filme ‘A Partida’

um Dia que Vale a Pena Viver”, lançado em 2016 (Casa da Palavra, R$ 29,90, 192 págs.).

Foi a partir desta obra que Tom Almeida se aproximou da médica. “Vivi uma experiênci­a com meu primo, que teve câncer no fígado”, conta ele. “Lemos o livro dela e isso transformo­u a vida dele. E a minha também.” DOENÇA TERMINAL Os cuidados paliativos não tratam exatamente de doenças graves e incuráveis, mas sim de pessoas com doenças incuráveis. É uma preparação para a morte. “O trabalho consiste na retirada da dor física e depois das dores emocional, espiritual e social”, diz Almeida. “E há fases onde o tratamento dá mais dano do que resultados”, diz Ana Claudia.

“Meu primo [que morreu em janeiro] ficou um ano e meio na fila de espera por um transplant­e”, conta Almeida. “O problema é que, quando não há mais o que ser feito em termos de medicina, há tudo a ser feito para a pessoa.”

“O impacto das conversas fez com que ele fosse muito mais em paz e com que a família também aceitasse o processo melhor. As preocupaçõ­es que ele tinha, as mágoas que gostaria de resolver, tudo isso foi sendo ajustado.”

“Tãoimporta­ntequantod­escobrir um câncer no início para começar o tratamento, é descobrir essa área da medicina chamada cuidados paliativos.”

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