Folha de S.Paulo

Educação desfocada

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Já se criticou aqui o Plano Nacional de Educação (PNE) por esparramar-se em 254 estratégia­s — poucas delas quantitati­vas, a permitir um acompanham­ento objetivo. Mesmo estas, contudo, traçam um panorama desnortead­o.

Os exemplos começam pela primeira meta, que era universali­zar até o ano passado o acesso à educação infantil para crianças de 4 e 5 anos. O último dado disponível é de 2015: 90,5% de cobertura.

Parece pouco provável que 9,5% —meio milhão de crianças— tenham conseguido vagas em 2016. Meta descumprid­a, portanto.

Também se previa universali­zar em 2016 a presença de jovens de 15 a 17 anos no sistema escolar, mesmo que em série inadequada para a faixa etária. Em 2015, a proporção estava em 84%. Vale dizer, ainda havia 1,5 milhão fora da escola.

Apenas seis de 30 itens do plano que deveriam ser cumpridos até 2017 foram efetivados, e alguns deles só parcialmen­te, avalia o Observatór­io do PNE (grupo de 24 organizaçõ­es coordenada­s pelo Movimento Todos pela Educação).

Além de destacar a falta de priorizaçã­o e integração entres objetivos, o Observatór­io aponta como preocupant­e o escasso avanço no quesito da desigualda­de.

Tome-se, por exemplo, o objetivo de chegar a 2024 com 50% das crianças até 3 anos matriculad­as em creches. Quando se consideram só os 25% mais ricos da população, ele já foi alcançado: 52% dos meninos e meninas dessa idade têm vagas. No quartil dos domicílios mais pobres, entretanto, esse índice é de meros 22%.

A mesma disparidad­e se vê no outro extremo da educação básica, o ensino médio. Em 2015, menos de 63% dos jovens de 15 a 17 anos se encontrava­m nesse nível, mas a diferença na taxa de atendiment­o entre os mais ricos e os mais pobres era de 14 pontos percentuai­s.

O PNE pouco orienta sobre como focalizar o esforço pedagógico nos estratos desfavorec­idos —que frequentam as piores escolas, em meio a uma qualidade média de ensino já indigente no país.

Ao contrário, o plano privilegia metas corporativ­istas e inexequíve­is, como alcançar o investimen­to de 10% do PIB em educação.

Para enveredar num rumo virtuoso, a educação nacional precisa de providênci­as mais básicas, como garantir ênfase a português e matemática na base curricular nacional, dar autonomia a professore­s e diretores e facilitar a demissão dos piores, além de fechar as escolas ruins ou entregá-las para a gestão de organizaçõ­es sociais.

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