Batalha ideológica nos EUA chega às gigantes de tecnologia
Demissão de funcionário do Google acusado de sexismo movimenta direita conservadora, que afirma que empresa foi intolerante
Um memorando de dez páginas que levou à demissão de um engenheiro do Google nesta semana expôs como a batalha ideológica que domina a política e as universidades americanas chegou agora às empresas do Vale do Silício.
James Damore perdeu o emprego depois que escreveu um texto questionando o que ele chama de tendência esquerdista do Google, enviou para um grupo de colegas e o documento se espalhou pela empresa, vazando também para a imprensa.
Nele, o engenheiro afirma que é preciso “parar de assumir que as diferenças de gênero [no trabalho] são consequência de sexismo”.
Ele argumenta que preferências e características inerentes a homens e mulheres podem explicar, em parte, por que homens dominam postos de liderança e na área de tecnologia do Google.
“As mulheres têm, em média, mais abertura a sentimentos e estética do que a ideias”, escreveu Damore, citando pesquisas.
O texto causou barulho na imprensa americana, e o presidente do Google, Sundar Pichai, disse que Damore foi demitido porque o texto “vai longe demais ao fazer avançar estereótipos nocivos de gênero” no local de trabalho.
A direita conservadora saiu em defesa de Damore, dizendo que o Google foi intoleran- te e não respeitou a liberdade de expressão. O fundador do WikiLeaks, Julian Assange, ofereceu emprego a Damore.
Mark Perry, especialista do centro de pesquisas conservador AEI, destacou dados do governo dos EUA que mostram que a proporção de mulheres graduadas em ciência da computação em 2015 (18% do total) é similar à participação delas nos empregos de tecnologia do Google (20%).
Para Marie Hicks, autora do livro “Programmed Inequality” (Desigualdade Programada), não só as pesquisas que Damore menciona são “altamente contestadas” como ele “ignora décadas de história em campo”.
“Ironicamente, muitos dos traços que ele identifica como de alguma forma prejudiciais à habilidade das mulheres de serem boas engenheiras de software são, na verdade, traços que todos os bons profissionais possuem”, diz, citando a capacidade de trabalhar com outras pessoas e de ser mais detalhista.
Ela ainda defende a decisão do Google ao lembrar que uma empresa não tem “as mesmas obrigações que o governo em assegurar o direito à liberdade de expressão”.
O Google, que nesta quinta (10) faria um evento sobre diversidade, desistiu do encontro. A justificativa foi preocupação com a segurança dos funcionários, depois que sites de direita publicaram o nomes de alguns que tinham proposto perguntas.