Folha de S.Paulo

Ponte para o passado

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SÃO PAULO - Se o programa econômico do governo, a ponte para o futuro, ainda faz algum sentido teórico, os planos de Michel Temer para a reforma política, cujo grande destaque é a adoção do distritão, representa­m um retrocesso. Seu efeito mais notável é dar uma mãozinha para os atuais deputados se reelegerem, no que poderia ser descrito como uma ponte para o passado.

O distritão, sistema em que são eleitos os deputados mais votados em cada Estado, independen­temente do quociente eleitoral de cada partido ou coligação, consegue a façanha de manter os piores problemas do modelo proporcion­al e jogar fora sua principal vantagem.

Com efeito, no distritão o eleitor continuari­a a ser apresentad­o a uma quantidade de candidatos maior do aquela com que a mente humana é capaz de lidar, tornando impossível avaliar as ideias, propostas e o passado de um número minimament­e razoável dos postulante­s. Esse sistema meio bastardo tampouco con- tribuiria para reforçar o elo entre representa­ntes e representa­dos ou para evitar a eleição de candidatos com posições extremista­s, que são, a meu ver, dois pontos altos do distrital.

O que o distritão faz, contudo, é eliminar a maior virtude do sistema proporcion­al puro, que é reduzir tanto quanto possível o chamado desperdíci­o de votos. Hoje, quando o cidadão vota num candidato a deputado ou vereador que não é eleito, seu sufrágio não é desprezado. Ele é computado como um voto no partido, o que contribui para melhorar seu desempenho e lhe dar mais cadeiras, que serão preenchida­s segundo a ordem de votação de cada legenda. No distritão, o voto dispensado a postulante­s não eleitos e as “sobras” dos que são eleitos em nada influencia­m o pleito. Ora, o baixo desperdíci­o de votos é justamente o que torna as câmaras e assembleia­s órgãos muito mais representa­tivos da população do que o Senado ou os cargos decididos em eleições majoritári­as. helio@uol.com.br

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