Folha de S.Paulo

Muitas vezes indaga de onde virá o próximo bilhão de usuários.

-

Para tentar furar o bloqueio do Facebook e de vários de seus aplicativo­s na China, Mark Zuckerberg fez questão de se encontrar com líderes chineses, ler a indigesta propaganda do Partido Comunista, estudar mandarim e falar o idioma em público.

Agora, porém, a rede social tenta entrar na China por outro caminho: autorizou o lançamento no país de um novo aplicativo que não carrega o nome Facebook.

O Facebook aprovou em maio o lançamento do Colorful Balloons, usado para compartilh­ar fotografia­s, segundo uma pessoa informada dos planos que falou sob condição de anonimato.

O aplicativo, cuja existência não havia sido relatada, tem aparência e funcionali­dade idênticos aos do Facebook Moments. Foi lançado por uma empresa chinesa independen­te, sem nenhuma indicação de sua afiliação à companhia americana.

O lançamento anônimo e sigiloso de um app na China por uma gigante estrangeir­a de tecnologia é inédito.

Demonstra o desespero e a frustração das empresas internacio­nais de tecnologia ao tentar ocupar espaço no maior mercado mundial de internet e indica até que ponto elas estão dispostas a ir —e a aceitar que os padrões para operar na China são diferentes de outros lugares.

A censura chinesa excluiu do boom da internet no país empresas como Facebook e Google. São mais de 700 milhões de internauta­s, que compram US$ 750 bilhões (R$ 2,3 trilhões) em produtos online por ano, mas são servidos por empresas locais que desenvolve­ram formas próprias de fazer negócios.

O Facebook espera aprender e assimilar essas formas de operar. Mas a rede social foi excluída do mercado chinês em 2009, e o Instagram, que ela controla, em 2014.

O WhatsApp foi parcialmen­te bloqueado em julho. E, embora o Facebook conte com mais de dois bilhões de usuários no planeta, Zuckerberg, seu fundador e presidente-executivo, BALÕES COLORIDOS Agora, o Colorful Balloons dá à empresa americana um meio de ver como os chineses compartilh­am informaçõe­s digitalmen­te e como interagem com suas plataforma­s favoritas de mídia social.

“Afirmamos há muito tempo o nosso interesse pela China, e estamos dedicando tempo a compreende­r e aprender mais sobre o país, de diversas maneiras”, afirmou o Facebook em comunicado.

Não se sabe se as diversas agências que regulament­am a internet na China sabem da existência do aplicativo.

A abordagem adotada pelo Facebook pode lhe causar novas dificuldad­es com um regime que mantém controle rigoroso sobre as empresas estrangeir­as de tecnologia.

“Não é só questão de negócios”, disse Teng Bingsheng, professor de gestão estratégic­a na Escola de Negócios Cheung Kong. “É política”.

Antes do Colorful Balloons, o Facebook havia adotado uma abordagem muito direta para cortejar a China.

Zuckerberg fez uma série de visitas ao país nos últimos anos e se tornou celebridad­e lá. Vídeos que o mostram falando mandarim viralizara­m, assim como a foto em que ele é visto correndo na Praça Tienanmen, em Pequim.

O Colorful Balloons representa a abordagem oposta — máxima discrição.

O aplicativo foi lançado pela Youge Internet Technology. O endereço registrado da empresa fica na zona leste de Pequim, mas o número mencionado nos documentos de registro não foi encontrado.

Segundo os documentos, a diretora executiva da Youge é uma mulher chamada Zhang Jinmei.

Ela aparece em uma foto de uma reunião recente entre o Facebook e o governo de Xangai, sentada ao lado de Wang Li Moser, executivo do Facebook cujas responsabi­lidades incluem promover um relacionam­ento melhor entre a empresa e o governo chinês.

A presença de Zhang em uma reunião dessa importânci­a indica que ela provavelme­nte é consultora ou funcionári­a do Facebook.

E se o Facebook pouco fez para promover o Colorful Balloons na China, ainda assim trabalhou para adaptar o aplicativo ao público local.

No resto do mundo, o Moments conecta usuários via Facebook. No caso do Colorful Balloons, a conexão acontece por meio da WeChat, maior rede social da China.

Projetado para recolher fotos dos álbuns de um smartphone e facilitar seu compartilh­amento, na China o app usa um QR Code, uma espécie de código de barra amplamente utilizado no WeChat.

O risco que o Facebook corre é alto. A empresa parece ter entregado um produto funcional à Youge, e o fez em qualquer indicação pública de que ele esteja conectado ao Facebook. Por ter acontecido pouco antes de um importante congresso do Partido Comunista, no fim deste ano, o lançamento secreto do Colorful Balloons pode solapar a confiança entre a empresa e o governo chinês. PAULO MIGLIACCI

“há muito tempo o China, e estamos dedicando tempo a compreende­r e aprender mais sobre o país, de diversas maneiras

COMUNICADO DO FACEBOOK

 ?? 18.mar.2016 /Facebook/Getty Images/AFP ?? Mark Zuckerberg (de cinza) corre em Pequim em dia poluído; dono do Facebook vinha cortejando regime chinês
18.mar.2016 /Facebook/Getty Images/AFP Mark Zuckerberg (de cinza) corre em Pequim em dia poluído; dono do Facebook vinha cortejando regime chinês

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil