Folha de S.Paulo

É muito ofensivo quando falam de nós como crianças em perigo, vítimas, abusadas, estupradas, espancadas. Cor-

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Folha - Por que alguém se torna um trabalhado­r sexual?

Pye Jakobsson - Porque é uma solução viável para o quebra-cabeças da vida dessas pessoas, seja para poder cuidar dos filhos, ter dinheiro suficiente para estudos ou recursos extras para manter uma mãe idosa. É trabalho dos sonhos? Provavelme­nte não. É o que sonharam ser quando eram crianças? Duvido. Então é uma opção para quem faltaram opções?

Este é um pensamento equivocado. As pessoas fazem diferentes escolhas para chegar o mais próximo possível da vida que querem ter. E, para algumas pessoas, isso envolve trabalho sexual. Muita gente não escolheu a área em que atua. Mas, quando o trabalho é sexual, a discussão toma outro rumo. Mas porque uma mulher escolheria o trabalho sexual a outra atividade que não exija qualificaç­ão formal, como ser garçonete, por exemplo?

Em primeiro lugar porque paga muito melhor (risos). E porque o trabalho sexual permite grande liberdade na administra­ção do seu tempo. Você pode trabalhar numa casa noturna e ter um horário fixo, mas se isso não couber na sua vida, sempre há outra casa, outro bar, outro site. É um trabalho associado a submissão, objetifica­ção e silêncio. O quanto disso é verdade?

Acho engraçado que aqueles que mais nos tratam como objetos não são nossos clientes, mas os que falam sobre nós, especialme­nte alguns círculos feministas.

Sou feminista, mas há ativistas que falam que somos objetos, penetradas por todo lado por homens, exploradas, abusadas, blá-blá-blá. Há um tanto de moralidade nisso e nos limites que querem impor ao que a mulher pode fazer com seu corpo e sexualidad­e.

Alguns podem imaginar que quem paga pode fazer o que quiser conosco, mas tudo é negociado. Feministas radicais difundem essa ideia e, com isso, nos colocam em perigo. Como assim? pos à mercê da violência dos homens. Isso nos coloca em perigo porque, se é dito reiteradam­ente que somos estupradas o tempo todo, então deixa de ser tão grave nos estuprar. Vira uma profecia.

Essas mulheres se rogam o direito de falar em nosso nome e decidir o que é bom para nós. Para mim, isso não se parece com feminismo, mas com o patriarcad­o que elas dizem combater. Como afirmar “meu corpo, minhas regras”, excluindo daí as mulheres que são trabalhado­ras sexuais? Esse tipo de segregação é insultante quando vem dos homens e não é menos ruim quando vem das mulheres. O que elas reivindica­m em nome das prostituta­s?

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