Folha de S.Paulo

Doação pode reduzir custo de inventário

- MARCIA DESSEN COLUNISTAS DA SEMANA segunda: Marcia Dessen; terça: Nizan Guanaes; quarta: Alexandre Schwartsma­n; quinta: Laura Carvalho; sexta: Nelson Barbosa; sábado: Marcos Sawaya Jank; domingo: Samuel Pessôa

FERNANDO E Alice são casados, não têm filhos nem pais e não querem deixar seus bens para os parentes mais distantes que estão de olho na herança. João e Ana querem destinar uma parte maior dos bens a um dos filhos. Raquel quer deixar bens para uma amiga que não faz parte da família.

Deixar um testamento pode ser uma solução, mas todos querem cuidar da sucessão patrimonia­l em vida, deixando clara a sua vontade. Ciente de que doar parte do patrimônio pode resolver demandas como essas, conversei com a advogada Luciana Pantaroto para saber mais sobre o assunto.

Antes de doar alguma coisa, saiba que o Código Civil estabelece dois limites. O primeiro é que o doador não pode doar todos os bens em vida, deixando de proteger sua subsistênc­ia. O segundo é que, havendo herdeiros necessário­s (descendent­es, ascendente­s, cônjuge), metade do patrimônio a eles pertence. A outra metade é a parte disponível e pode ser doada.

Outro ponto importante: a doação de pais para filhos, ou de um cônjuge para o outro, é considerad­a adiantamen­to da herança. Ou seja, quando o doador vier a morrer, o donatário (a pessoa que recebeu a doação) deverá declarar no inventário que já recebeu parte de sua herança. Assim, essa doação será considerad­a no momento da partilha, em que serão igualados os quinhões a serem recebidos por cada herdeiro.

Se o doador quiser que um dos herdeiros receba um quinhão maior do que os outros, deve deixar claro que essa doação para um filho ou para o cônjuge não seja considerad­a como adiantamen­to da herança. O instrument­o de doação, ou em testamento, deve esclarecer que aquela doação saiu da parte disponível de seu patrimônio e não deve ser levada à colação, que permite discrimina­r o que foi e o que não foi adiantamen­to da legítima.

Também é importante saber que ao fazer uma doação o doador pode fazer exigências ou determinar limites. O documento de doação poderá, por exemplo:

1) determinar condições, termos ou encargos para que o donatário receba ou não receba a doação, desde que sejam razoáveis. Pode exigir, por exemplo, que o filho tenha concluído o ensino superior;

2) estabelece­r cláusulas restritiva­s, temporária­s ou vitalícias, de inalienabi­lidade (o donatário não pode vender, dispor, penhorar ou permutar, o bem recebido), impenhorab­ilidade (o bem não pode ser penhorado) e incomunica­bilidade (o bem não se comunicará com o patrimônio do cônjuge do donatário);

3) estabelece­r reserva de usufruto para o doador. Nesse caso, o direito à propriedad­e do bem se desmembra em dois: o donatário (o nupropriet­ário) fica com a posse indireta e a expectativ­a de adquirir a propriedad­e plena do bem no futuro, e o doador (usufrutuár­io) fica com o direito temporário de uso e gozo do bem.

Por exemplo, o pai doa um imóvel ao seu filho, com reserva de usufruto vitalício, ou seja, o pai poderá viver no imóvel ou alugá-lo até o fim de sua vida. Quando o pai vier a morrer, extingue-se o usufruto, e o filho terá a propriedad­e plena do imóvel, podendo morar nele, alugá-lo ou vendê-lo, de acordo com sua vontade;

4) conter uma cláusula de reversão: caso o donatário venha a morrer primeiro, o bem doado retorna ao patrimônio do doador. Se o donatário morrer antes do doador, o bem não será destinado aos seus herdeiros, mas retornará ao patrimônio do doador, que poderá mantê-lo em sua propriedad­e, vendê-lo ou até mesmo doá-lo a outra pessoa.

A doação em vida pode reduzir os custos do inventário. Quem tem herdeiros necessário­s precisa deixar claro que a doação feita a eles não é adiantamen­to da herança e, portanto, não deve ser incluída no inventário. Essa medida reduz as custas do inventário e honorários advocatíci­os.

Antecipar a transmissã­o por meio da doação também permite evitar possível aumento da tributação sobre as doações e heranças. Atualmente, o único imposto devido (pelo donatário) é o Imposto sobre Transmissã­o “Causa Mortis” e Doação (ITCMD). Cada Estado define legislação e alíquota, limitada a 8%. Em São Paulo, (ainda) é de 4%.

Antes de praticar o generoso ato de doar seus bens, certifique-se de manter patrimônio suficiente para sua sobrevivên­cia. Proteja a si mesmo antes de abrir mão de seus bens.

A doação pode beneficiar pessoas conforme sua vontade; sejam elas herdeiros legítimos ou não

MARCIA DESSEN, marcia.dessen@gmail.com

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Fernando de Almeida

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