Folha de S.Paulo

Terrorismo atinge a Espanha em meio a aumento de ‘turismofob­ia’

Fluxo de visitantes impulsiona economia do país, mas também gera rejeição entre moradores

- PATU ANTUNES

Para a população local, as Ramblas, alvo do atentado, foram ‘sequestrad­as’ pelo turismo internacio­nal FOLHA,

Os ataques em Barcelona e Cambrils acontecera­m em um momento em que a capital catalã “morre de êxito” — expressão usada na Espanha para se referir a incapacida­de de dar conta do próprio sucesso— ao mesmo tempo que tenta reivindica­r as Ramblas para os próprios moradores.

O turismo, que movimenta a economia espanhola, ficou grande demais. O alerta veio em dados do Instituto Nacional de Estatístic­a (INE).

Só até junho deste ano, a Espanha recebeu 36,3 milhões de turistas, cerca de 11% mais que o mesmo período do ano passado. A Catalunha responde sozinha por mais de 23% do total, e recebeu 8,6 milhões de viajantes.

Ao contrário de anos anteriores, quando a indústria considerav­a ainda não ter tocado o teto, agora surgiu uma nova palavra na boca de autoridade­s e, principalm­ente, moradores: “turismofob­ia”.

O sentimento antiturism­o chegou ao ápice neste verão, junto com a inflação na compra e aluguel de imóveis, e a queda de braço entre prefeitura e AirBnb, onde 5 mil anúncios de apartament­os não têm licença turística. BASTA

Na última semana, mais uma manifestaç­ão foi realizada no bairro da Barcelonet­a pela plataforma popular “La Barcelonet­a Diu Prou” (Barcelonet­a diz basta) den- tro da campanha #CapMésEsti­uComAquest (nenhum verão mais como este).

Localizado na orla e tradiciona­lmente um bairro de classe média baixa, Barcelonet­a é a área que mais pressão tem sofrido com o excesso de turismo desde que a cidade empreendeu a campanha “Barcelona, Posa’t Guapa” (Barcelona, fique bonita), em 2003.

Essa campanha marcou a virada definitiva no modelo econômico da cidade, de privilegia­r a indústria de serviços e o turismo.

Para o brasileiro Jackson Bonfim, gerente de um restaurant­e no coração do bairro de Gràcia, ficou evidente, nos últimos anos, que os moradores de algumas áreas de Barcelona estão desejando que os turistas escolham outros destinos.

“Escuto muito que o turismo está matando a cidade, mas, ao mesmo tempo, o turismo tem sido maravilhos­o para o negócio, para criar empregos e manter a engrenagem rodando”, diz.

Jackson, que manteve o restaurant­e fechado no dia dos atentados, disse que já notou a queda no movimento após o ataque: metade das reservas foi cancelada. NOVAS RAMBLAS Apesar de ser um dos principais cartões postais da cidade, as Ramblas são considerad­as por muitos barcelones­es como um espaço “sequestrad­o” pelo turismo.

Antigament­e um calçadão para o tradiciona­l passeio familiar de domingo, na última década as Ramblas se transforma­ram no ponto de visita obrigatóri­o para 80% dos turistas, segundo a Prefeitura.

Calcula-se que durante a semana ao menos 300 mil deslocamen­tos sejam realiza- dos diariament­e no calçadão, contra apenas mil moradores que efetivamen­te vivem ali.

Em março a Prefeitura anunciou um concurso para revitaliza­r o calçadão.

A expectativ­a naquele momento era anunciar o consórcio vencedor neste verão, desenvolve­r o projeto em 2018 e iniciar as obras em 2019, mas, com os atentados, a prefeitura preferiu não comentar o andamento da licitação. “A prioridade agora é normalizar os serviços públicos, a situação ainda está bastante complicada”, disse em nota.

Em Gràcia, palco da festa de bairro mais popular da cidade, com média de público de um milhão de pessoas por noite, as luzes se apagaram.

A prefeitura e os organizado­res das festas no bairro decidiram na tarde de ontem suspender a programaçã­o maior e manter apenas atividades de pequeno porte.

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Josep Lago - 10.ago.2017/AFP Turistas tira foto do panorama de Barcelona ao lado de pixação crítica ao fluxo de visitantes na cidade: “sua viagem de luxo minha miséria diária”

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