Folha de S.Paulo

A bagagem do preso

- JANIO DE FREITAS

A SUSPENSÃO, pelos procurador­es da Lava Jato, das negociaçõe­s para a delação premiada de Eduardo Cunha tem versões demais. No que mais interessa, nenhuma tem importânci­a. A suspensão, sim, contém ameaças variadas à necessária verificaçã­o de ganhos ilícitos, de uma parte, e vantagens empresaria­is, de outra, em setores apenas sobrevoado­s ou nem considerad­os até agora nas delações e alegadas investigaç­ões.

Entre os já citados na Lava Jato, Cunha é, sem dúvida, quem mais conhece —por experiênci­a pessoal e por sua bagagem de informaçõe­s — a diversidad­e de setores e personagen­s ativos no mundo das transações obscuras. Exemplo recente da relevância de delações de Cunha veio da própria Polícia Federal, investigad­ora na Lava Jato.

Em relatório ao ministro Edson Fachin, a PF diz que “não encontrou” elementos compromete­dores de Aécio Neves no chamado caso Furnas, que cochila há uns dez anos. Haja ou não o comprometi­mento comentado há muito tempo, não encontrar não significa inexistir. Cunha, a quem Aécio tratou no Congresso com muita deferência, conhece por dentro todo o caso. Desde a nomeação, para Furnas, do indicado de Aécio, Dimas Toledo.

Habitação popular? É com Cunha mesmo. Telefonia, negócios brasileiro­s e portuguese­s em torno da Oi são com Cunha. Caixa Econômica, seus (ex-)vices Geddel Vieira Lima e Moreira Franco e negócios ainda não apurados ou nem conhecidos são com Cunha. Dinheiro para determinad­as votações na Câmara? Posto Ipiranga. Quer dizer, Eduardo Cunha, como tantos assuntos mais.

Não há dúvida de que as revelações oferecidas por Cunha para o acordo de premiação estão aquém do valor possível. Mas nem como pressão é promissor o corte das negociaçõe­s, a um mês da substituiç­ão de Rodrigo Janot por uma situação de incógnita. Mais parece birra da presunção paranoide de alguns salvadores do país, confrontad­os com as resistênci­as do seu prisioneir­o. O RACHA O senador Tasso Jereissati é uma lembrança do PSDB das origens, esquecido por chefões e chefetes. Esquecido, não. Abandonado, não sendo impróprio dizê-lo traído. Aí começa a reação irada de uma banda do partido ao programa transmitid­o sob a orientação de Jereissati, na condição de presidente interino (a bem da imagem partidária, porque o efetivo é o acusado Aécio). A reação explodiu porque o programa disse e repetiu coisas como “o PSDB errou”, sem explicitar os erros, mas sugerindo estarem na adesão à troca de favores típica do “presidenci­alismo de cooptação”. A adesão à “velha política”. São quatro os peessedebi­stas no ministério.

A reação ao programa foi, portanto, pelas verdades reconhecid­as e expostas. O ataque ao programa e a Jereissati feito por Aloysio Nunes Ferreira omitiu sua condição de ministro de um presidente criminalme­nte denunciado. Ministro por que, senão pela “velha política” de troca de apoio por cargos e suas vantagens? Como ministro das Relações Exteriores, Aloysio fala pelo denunciado Temer e o representa, aqui e no exterior.

Na Lava Jato, Cunha é quem mais conhece a diversidad­e de personagen­s no mundo das transações obscuras

BRASILEIRI­NHAS — A Prefeitura do Rio quer liberar prédios sem garagem, nos bairros com melhor transporte, para incentivar construçõe­s. Presentes ou futuros, moradores desses bairros, os melhores, são os que mais têm carros. A Prefeitura ainda não percebeu que garagens nos prédios são para desobstrui­r ruas: quer menos garagens e mais obstrução. E mais lucro para os incorporad­ores.

— Antes de existir, o Museu da Escravidão tem o seu nome reprovado: querem acrescenta­r-lhe “e da Liberdade”. Na forma original, dizem, seria uma citação do sofrimento. É a hipocrisia em ação, ainda hoje.

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