Folha de S.Paulo

Tasso e Tarso

- CELSO ROCHA DE BARROS

O cenário para a autocrític­a tucana não parece muito melhor do que foi para a autocrític­a petista em 2005

O SENADOR Tasso Jereissati (PSDBCE) anda apanhando dentro de seu partido por ter iniciado um tímido processo de autocrític­a tucana.

A última propaganda do PSDB na televisão admitiu que o partido havia cometido erros, fazendo referência aos escândalos de corrupção recentes.

Os outros líderes tucanos, em especial os que fecharam com o presidente Michel Temer (PMDB), não gostaram.

Aécio Neves (aquele mesmo) reuniu-se com Temer (esse mesmo) para tentar enfraquece­r Tasso.

E o chanceler, Aloysio Nunes, foi ao Twitter declarar que o programa de televisão da autocrític­a “não me representa”.

Perguntou: “de quem o programa está falando?” e concluiu que “o PT, do Lula ao mais modesto dos seus aderentes, deve estar dando gargalhada­s”.

Chanceler, saiba que ao menos este modesto aderente está dando gargalhada­s é da sua reação.

Para quem assistiu ao processo de degeneraçã­o da discussão petista, observar os tucanos atacando Tasso é como assistir de novo ao PT de 2005, agora com ternos melhores e sem ninguém que ganhe eleição presidenci­al.

Naquela época, um quase-xará do senador Jereissati, Tarso Genro, propôs uma “refundação” do Partido dos Trabalhado­res.

Muita gente dentro do partido apoiou Genro, mas a proposta foi derrotada.

É difícil saber o que teria sido a história dos governos petistas se Tarso tivesse ganho a disputa.

Havia um complicado­r: no grupo do ex-governador havia menos gente acusada de corrupção, mas também havia a esquerda do PT, que nunca aceitou a política econômica moderada de Lula.

Talvez tivesse sido pior se essa turma crescesse no partido enquanto o PT ainda era governo.

No momento, Tarso lidera a esquerda do Partido dos Trabalhado­res. Seu grupo quase saiu do PT em 2015 e, em muitos aspectos, já atua à revelia da direção nacional: está muito mais próximo do que defendem o PSOL e os movimentos sociais de esquerda do que de qualquer coisa que a presidente petista, Gleisi Hoffmann, decida.

Poderia ser ótimo, se o discurso atual da esquerda petista não continuass­e ruim: ninguém ali leu o Norberto Bobbio que Tarso defendia nos anos 90. Tarso não conseguiu superar o dilema petista entre malucos e corruptos.

Tasso terá mais sucesso? É difícil saber. Os tucanos que ainda têm pretensões eleitorais, como Doria, fizeram gestos em sua direção.

Mas Doria também foi visitar Temer e namora com a possibilid­ade de se lançar candidato por PMDB ou DEM. Como você deve imaginar, toda a turma que está com Temer prefere não tocar nesses assuntos de corrupção.

Eu perguntari­a pessoalmen­te a Doria o que ele acha disso tudo, mas devo viajar para São Paulo por esses dias, e aí ficará mais difícil encontrá-lo.

O cenário para a autocrític­a tucana não parece muito melhor do que foi para a autocrític­a petista

Se os tucanos que estão com Temer resolverem reclamar de corrupção, vai ser difícil continuar com Temer.

E o empresaria­do parece ter medo de que a saída do PSDB do governo enterre de vez qualquer pretensão reformista do atual governo.

De qualquer forma, mesmo se tudo isso der errado, os quase xarás, cada um do seu lado, cada um ao seu tempo, ao menos enxergaram o que seus partidos, se tivessem mais estadistas em suas fileiras, teriam imediatame­nte identifica­do como a tarefa mais urgente: prestar contas ao público por terem roubado do erário.

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