Folha de S.Paulo

Aceleração da dívida faz Brasil destoar de outros emergentes

Endividame­nto público supera 80% do PIB pelo critério adotado pelo FMI e não deve parar de subir antes de 2022

- GUSTAVO PATU

Receitas do governo menores do que as despesas e juros elevados impedem mudança na trajetória

Pelas contas do FMI (Fundo Monetário Internacio­nal), a dívida pública brasileira já equivale a mais de 80% da renda nacional, um patamar que destoa entre os principais países emergentes.

O governo brasileiro adota outro critério de cálculo, pelo qual a dívida ainda está em 73% do PIB (Produto Interno Bruto), não muito acima dos quase 70% registrado­s pela Índia, a segunda no ranking.

Na lista das principais economias em desenvolvi­mento, apenas o Brasil apresenta trajetória explosiva de endividame­nto do governo, que não será interrompi­da antes de 2022.

Nesse cenário, as diferenças de metodologi­a importam pouco: seja nas contas do FMI ou nas do governo, a situação brasileira não tem paralelo no mundo emergente.

O Fundo inclui na dívida títulos do Tesouro Nacional que são negociados pelo Banco Central para regular a quantidade de dinheiro na economia; o governo, não.

Mas o que interessa é a tendência, que é a mesma nos dois cálculos: expansão contínua, motivada pelo buraco nos orçamentos de União, Estados e municípios.

Alguns argumentam que a dívida brasileira não é alta, se comparada às de países ricos como EUA e Japão —a tese era muito repetida no governo Dilma Rousseff.

Tais países têm, isso sim, capacidade de endividame­nto maior. Com dispõem de boa reputação e moedas aceitas globalment­e, conseguem tomar dinheiro emprestado com mais facilidade e a juros mais baixos.

A dívida pública do Japão passa de 200% do PIB, mas o gasto com juros não chega a 1%. A despesa brasileira, hoje, beira os 7% do produto. É mais do que se aplica em educação no país. AJUSTE Os encargos financeiro­s do governo estão em queda, graças à redução das taxas de juros promovida do Banco Central. Ainda assim, permanecem muito acima dos padrões internacio­nais.

Para estancar já a escalada da dívida, seria necessário destinar ao pagamento de juros uma parcela expressiva da receita da União.

A arrecadaçã­o, porém, é insuficien­te até para cobrir gastos cotidianos —como pessoal, custeio administra­tivo e programas sociais— e as obras públicas. Isso significa que o governo tem deficit primário (sem contar a despesa financeira).

O governo acaba de elevar para R$ 159 bilhões sua projeção para esse deficit neste ano (eram R$ 139 bilhões) e no próximo (antes, previa-se queda para R$ 129 bilhões).

Só haverá superavit primário quando a receita crescer acima da inflação por anos consecutiv­os, o que, por sua vez, depende da retomada da economia. Como estão congelados em termos reais, em algum momento os gastos se tornarão inferiores à arrecadaçã­o.

Nas novas contas oficiais, isso só acontecerá no início da próxima década, ou seja, no mandato do presidente a ser eleito no próximo ano.

A queda da dívida pode demorar ainda mais, porque os primeiros saldos positivos do Tesouro Nacional tendem a ser modestos.

Os cálculos pressupõem cresciment­o econômico de 2% no próximo ano, com ligeira melhora, para 2,6%, até 2020. Taxas mais favoráveis encurtaria­m o ajuste orçamentár­io; qualquer decepção com o PIB teria o efeito oposto. ENTENDA A DIFERENÇA Critério do FMI Critério do Brasil Dívida interna e externa de União, Não considera os títulos do Tesouro Estados e municípios, consideran­do Nacional negociados pelo Banco títulos do Tesouro Nacional Central para regular a quantidade negociados pelo Banco Central de dinheiro na economia DÍVIDAS DOS PAÍSES RICOS Em 2016, % do PIB 239,2 Japão Projeções

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