Folha de S.Paulo

Representa­sse cresciment­o e desenvolvi­mento na administra­ção pública. Hoje, a cultura é vista como administra­ção de artes e patrimônio.

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Com uma unidade recéminaug­urada no centro paulistano, na rua 24 de Maio, e várias outras a caminho, o diretor-regional do Sesc-São Paulo, o ex-seminarist­a e gestor cultural Danilo Santos de Miranda, 74, já se acostumou com o apelido de “verdadeiro ministro da Cultura do Brasil”.

O orçamento da instituiçã­o neste ano é de R$ 2,3 bilhões (parte da receita vem da cobrança sobre folhas de pagamento; veja quadro abaixo). Já a pasta em Brasília teria quase R$ 2,7 bilhões (não fosse o congelamen­to de verbas).

No cargo desde 1984, Santos de Miranda afirma à Folha que “trabalha pensando como se nunca fosse sair daqui”, ao ser questionad­o sobre uma eventual aposentado­ria.

Diz que nunca foi convidado para ser ministro, que não teria “entusiasmo” pelo cargo no quadro atual e que a cultura não deve ser só administra­dora de artes e patrimônio.

Ele também defende mudanças na Lei Rouanet e critica a influência dos departamen­tos de marketing das empresas na destinação de verbas. Em 2016, esse que é o principal mecanismo de fomento à cultura do país injetou cerca de R$ 1,1 bilhão no setor.

“Seria melhor que houvesse um fundo com parte dos recursos dessas leis a ser investidos por decisão do administra­dor público, com critérios, mais equânime”, afirma. Folha - O sr. já declarou que nunca foi convidado para ser ministro da Cultura. Gostaria?

Danilo Miranda - Nunca, nunca. Fui cogitado várias vezes, mas não por quem tem o poder de convidar [risos]. Toda ação é política, mas nunca me envolvi na política partidária. Só iria no caso de um projeto mais amplo, de cultura que O que precisaria mudar?

Precisa ter papel mais relevante, na educação, nos planos econômicos. Jacques Lang, quando foi convidado pelo então presidente François Mitterrand a ser ministro da Cultura, respondeu: “só aceito se for o primeiro-ministro da Cultura, para tudo”.

A Cultura tem que estar presente na discussão sobre presídios, drogas, hospitais. Já compartilh­ou um único ministério com a Educação, hoje tem seu próprio ministério, o que acho bom, mas tem que trabalhar com Educação também. Nesse quadro atual, não teria nenhum entusiasmo. Desde o século retrasado, governos se preocupam mais com o ensino superior, onde só chega uma minoria, que com o ensino fundamenta­l. Na política cultural, não acontece o mesmo, os impostos pagam a cultura da elite? rada e desenvolvi­da. A indústria cultural não pode prevalecer sobre o interesse público. Só se tivesse relevância. Como fazer isso?

As leis de incentivo distribuem recursos atendendo também a interesses empresaria­is. Acho que a balança com os dois pratos deveria pender mais para o interesse público. Na prática, não acontece, são os departamen­tos de marketing que têm mais poder. Fica tudo concentrad­o no eixo Rio-São Paulo.

Seria melhor que houvesse um fundo com parte dos recursos dessas leis a ser investidos por decisão do administra­dor público, com critérios, mais equânime. A Cultura sofreu cortes nos mandatos de Ana de Hollanda, Marta Suplicy e Juca Ferreira, mas parece que a classe artística só se mobilizou contra ministros da pasta no governo Temer. Houve partidariz­ação?

Hoje, os cortes são generaliza­dos. Antes, eu achava que o problema dos recursos para a cultura era de má gestão. Hoje, falta tudo. Sesi Senai Arrecadaçã­o de outras entidades via Receita, em R$ bilhões 4,64 3,15 2,57 0,74 0,47 que posso ser demitido hoje pelo presidente da Federação do Comércio [Abram Szajman], que tem essa prerrogati­va. Trabalho pensando como se nunca fosse sair daqui. Nas novas unidades, no dia a dia, na programaçã­o. Penso que ainda tenho muita energia. Sucessões têm sido dramáticas no Brasil, dos sucessores se voltando contra quem os indicou, ou dos líderes que não formaram ninguém. O sr. pensa nisso?

O bom gestor cuida da ação atual e prepara pessoas em seu entorno que possam assumir seu papel. Penso estar fazendo isso. Vários poderiam me substituir. Mas sou realista. Não vou decidir quem vai me suceder. Provavelme­nte, será quem suceder o Szajman. Mas temos muitos quadros preparados aqui. No momento de crise, há várias vozes pedindo o corte da contribuiç­ão compulsóri­a ao chamado “sistema S”, do qual o Sesc faz parte. Daria para mudar esse imposto?

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