Folha de S.Paulo

Violência no Rio faz escola de samba criar ‘matinê’

Com escalada de homicídios, agremiaçõe­s decidem mudar o horário dos ensaios

- SÉRGIO RANGEL

Crise na segurança já fez mortes violentas crescerem 15% no 1º semestre em relação ao mesmo período de 2016 DO RIO

O samba vai acabar mais cedo. Pelo menos na Portela e na Unidos da Tijuca. As duas escolas decidiram antecipar o horário das disputas dos sambas-enredo para o próximo Carnaval por causa da violência no Rio.

Atual campeã, a Portela trocou até o dia. Antes, a disputa começava nas noites de sexta por volta das 23h e só terminava no dia seguinte. No domingo (20), a primeira eliminatór­ia foi realizada num horário de “matinê”. A festa começou às 17h e terminou pouco depois das 23h.

“Quando cheguei em casa cedo, minha mulher nem acreditou. Mas a coisa está feia nas ruas. A própria ala dos compositor­es pediu a mudança e achei bastante razoável”, justifica Luis Carlos Magalhães, presidente da Portela.

O Rio sofre com a escalada da violência. No subúrbio, reduto das escolas de samba, as ruas ficam vazias mais cedo. O número de mortes violentas no Estado no primeiro semestre deste ano (3.457) cresceu 15% em relação ao mesmo período de 2016. Foi o pior primeiro semestre desde 2009.

“Num período de menos de um ano, muita coisa mudou aqui. A troca de horário é reflexo da violência, diz o presidente da Portela, que é funcionári­o LUIS CARLOS MAGALHÃES presidente da Portela público e sofre com a crise financeira do Estado.

A Unidos da Tijuca adiantou também o início da escolha do samba. Na quinta (24), a escola do Morro do Borel faz o seu “happy hour” a partir das 18h. Acaba às 23h.

“Antes, ficávamos até 3h, mas a situação mudou. As pessoas estão com receio de voltar pra casa tão tarde. Por isso, fizemos esse horário alternativ­o”, explica Fernando Horta, presidente da escola.

Para atrair mais público, o dirigente decidiu também não cobrar ingresso. “A crise econômica está muito forte no Rio. Estamos tentando ajudar os competidor­es de todo jeito”, acrescento­u Horta.

Em novembro, com os sambas definidos, as escolas começam os ensaios, que viram a noite nas quadras. Algumas estudam mudar o horário.

“Na minha adolescênc­ia, o bacana era chegar na escola e contar que tinha visto o sol raiar na Mangueira durante o ensaio. Acho difícil isso acontecer este ano. Infelizmen­te, não sou nada otimista. Mas vamos ver o que acontece até lá”, diz o presidente da Portela. ESCOLAS A onda de violência que atinge cidade fez também com que nesta semana, prefeitura anunciasse o fechamento de 15 escolas da região do Jacarezinh­o, na zona norte carioca, por tempo indetermin­ado.

Outras 11 unidades na região do Jacarezinh­o e de Manguinhos terão mudança no horário de funcioname­nto.

A Secretaria Municipal de Educação afirmou, em nota, que a decisão pelo fechamento foi tomada após uma reunião com 26 diretores de escolas das duas comunidade­s, onde também foi definida uma área de maior risco.

Também sinal da violência que atinge o Estado é o número de mortes de policias militares. Quase cem PMs foram assassinad­os no Rio de Janeiro neste ano. Em 2017, um PM foi morto a cada dois dias. O número inclui mortos em serviço (21), em folga (56) e aposentado­s (20), todas vítimas de ações violentas. Nesse ritmo, caminha em direção à assombrosa marca de 200 casos em um ano –o maior número foi atingido em 1994, quando morreram 227 policiais.

“adolescênc­ia, o bacana era chegar na escola e contar que tinha visto o sol raiar na Mangueira durante o ensaio. Acho difícil isso acontecer este ano. Infelizmen­te, não sou nada otimista. Mas vamos ver o que acontece até lá

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