‘VERGONHA’, DIZ GISELE BÜNDCHEN
Pesquisadores encontraram, em uma região que fazia parte da Renca (Reserva Nacional de Cobre e seus Associados), peixes contaminados por mercúrio.
Na quarta (23), foi publicado um decreto do presidente MichelTemerrevogandoostatus de Reserva Nacional da Renca, reserva mineral criada em 1984 para evitar a perda de recursos estratégicos.
Os dados —obtidos com exclusividade pela Folha e fruto de pesquisa do WWF-Brasil e do ICMBio— apontam que, no Parque Nacional MontanhasdoTumucumaqueena Flona (Floresta Nacional) do Amapá, que não fazia parte da Renca, em 81% dos espécimes investigados há contaminação por mercúrio.
Asubstânciaéummetalpesado utilizado no processo de extração do ouro. Paulo Cesar Basta, médico da Fiocruz, diz que não há níveis seguros de exposição à substância.
Foram analisados 187 peixes, coletados em 33 locais. Destes, 151 apresentavam contaminação por mercúrio.
Segundo Marcelo Oliveira, do WWF-Brasil, oito espécies foram investigadas: piranha-preta, trairão, piranhaamarela, mandubé, pintado, pirarara, cachorra e pirapucu. Cinco espécies tinham mais de 50% dos indivíduos com níveis de mercúrio superiores a 0,5 mg/kg —limite de tolerabilidade da OMS (Organização Mundial da Saúde) para consumo humano.
As cinco espécies encontradas com níveis de mercúrio acima do indicado pela OMS são piranha-preta , trairão, pintado, cachorra e pirapucu.
“São espécies consumidas pela população da região e obtivemos esses números alarmantes. É um problema de saúde pública”, diz Oliveira. “Se começar a juntar os pontos, você vê que o cenário é bastante preocupante.”
Paulo Basta afirma que “o mercúrio é um metal pesado com fácil difusão no corpo e que altera o metabolismo celular. O sistema nervoso central, principalmente, é vulne- rável à substância”.
Oliveira e Basta, na segunda etapa do projeto, estudam a saúde das populações dos arredores. Serão investigadas outras nove áreas —entre elas, florestas nacionais e parques nacionais— e quatro terras indígenas. Oliveira diz que, durante a nova etapa, já foram encontrados indígenas com sintomas de contaminação.
Após a extinção da Renca, ambientalistas demonstra- ram preocupação com uma possível corrida pela ouro na região e com a pressão sobre terras indígenas e áreas de preservação. A questão de saúde pública e contaminação da cadeia alimentar também deve receber atenção, segundo o pesquisador da WWF.
“Se aumentar a permissividade para esse tipo de atividade [mineração] na Renca, o panoramaparacontaminação é de piora”, afirma o cientista A atriz e modelo Gisele Bündchen se manifestou em rede social sobre a extinção da Renca pelo governo Temer. “Estão leiloando nossa Amazônia! Não podemos destruir nossas áreas protegidas em prol de interesses privados”, disse. daWWF,segundooqual,mesmo em áreas legais de garimpo, há altas taxas de contaminação ambiental e de problemas de saúde.
A assessoria da Presidência da República, em nota, disse que a extinção da Renca não afeta as áreas de proteção integral presentes na região e que qualquer empreendimento futuro ” terá de cumprir exigências federais rigorosas para licenciamento específico, que prevê ampla proteção socioambiental, como já mencionado no decreto”.
“A Renca não é um paraíso, como querem fazer parecer, erroneamente, alguns. Hoje, [...] territórios da Renca original estão submetidos à degradação provocada pelo garimpo clandestino de ouro, que, além de espoliar as riquezas [...], destrói a natureza e polui os cursos d’água com mercúrio”, continua a nota, que termina dizendo que o “compromisso do governo é com soberano desenvolvimento sustentável da Amazônia”.