Cade quer estimular ações de consumidores contra cartéis
Órgão prepara regras para compartilhar provas obtidas em investigações
Informações podem ajudar empresas e cidadãos a recuperar na Justiça perdas sofridas com práticas desleais
Para tentar estimular indenizações civis e potencializar os efeitos das multas aplicadas, o Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) definirá, nas próximas semanas, regras para compartilhamento de provas de cartéis julgados pelo tribunal com consumidores em geral.
Uma pessoa que adquiriu uma geladeira, por exemplo, fabricada ou vendida por empresas envolvidas em cartel, poderá ir à Justiça com provas obtidas pelo Cade para exigir reparação. Em geral, um cartel eleva os preços de produtos e serviços em 20%.
“Nos Estados Unidos, essa é uma prática madura [as ações cíveis para reparação]. Aqui ela é incipiente”, afirmou em entrevista à Folha o presidente do Cade, Alexandre Barreto. “A maior dificuldade [para os consumidores] é a comprovação dos prejuízos. O Cade tem essas informações e quer fornecê-las aos cidadãos e às empresas que compram insumos de empresas que praticaram cartel.”
Segundo Barreto, a ideia surgiu após discussão entre os conselheiros do órgão de defesa da concorrência sobre a dosimetria das multas em um caso envolvendo a prática de cartel numa licitação de serviços de manutenção predial, há algumas semanas.
Os conselheiros Cristiane Alkmin e João Paulo de Resende defenderam que as multas contra cartéis eram brandas porque vêm sendo calculadas tendo o faturamento no ramo de atividade como parâmetro e só no ano anterior à abertura do processo de investigação no Cade. Muitos cartéis atuam por décadas. O do sal, por exemplo, durou mais de vinte anos.
Segundo os dois conselheiros, a legislação brasileira determina que a multa nunca pode ser inferior à vantagem auferida. Caso contrário, valerá a pena formar cartéis.
Alkmin e Resende foram voto vencido, e o Cade decidiu não fazer o cálculo da vantagem auferida pelos cartéis —algo que exigiria mais funcionários e tempo, segundo os demais conselheiros.
No entanto, Barreto propôs medidas coordenadas que pudessem ampliar os efeitos das multas de outras maneiras. Segundo ele, hoje o Cade já pode proibir as empresas de participar de licitações, parcelar débitos tributários e levantar empréstimos em bancos públicos.
Além da multa aplicada às empresas do cartel de administração predial, Barreto decidiu recomendar ações contra as empresas a outros órgãos de controle, como o TCU (Tribunal de Contas da União) e os Tribunais de Contas
ALEXANDRE BARRETO
Presidente do Cade de Estados e municípios em que o grupo atuou.
“Defendo a atuação em rede dos órgãos de controle. Cabe ao TCU calcular dano. O órgão já tem os profissionais para desempenhar esse trabalho”, disse Barreto. “Já representamos contra essas empresas junto a esses órgãos.” IMPACTO A partir de agora, eles deverão fazer suas próprias investigações a partir das provas fornecidas pelo Cade para exigir reparações. “Consegue imaginar qual é o impacto dissuasório para uma empresa? Com essas medidas, uma empresa vai pensar diversas vezes antes de formarem cartel”, afirma Barreto.
O presidente do Cade acredita que a “central de provas” estará funcionando até o final do primeiro semestre de 2018. Para isso, será preciso que o conselho decida os procedimentos necessários para a prestação desses serviços.
“Não sabemos se será um sistema novo que poderá ser acessado pela internet automaticamente ou se a pessoa deverá solicitar ao Cade, tudo isso vai ser decidido por meio de uma resolução”, disse.
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A maior dificuldade [para os consumidores] é a comprovação dos prejuízos. O Cade tem essas informações e quer fornecê-las a cidadãos e empresas