Folha de S.Paulo

País tem 23% das cidades em emergência

Municípios recorrem ao governo federal devido a inundações e estiagens; R$ 200 milhões foram repassados neste ano

- THIAGO AMÂNCIO

Nordeste do país e norte de Minas Gerais são castigados por secas; Norte, Sul e Sudeste sofrem com chuvas

Em meio a uma das secas mais severas já registrada­s no Nordeste e com chuvas que deixam um rastro de destruição no outro extremo do país, a região Sul, um quarto dos municípios brasileiro­s estão em situação emergencia­l, segundo levantamen­to feito pela Folha com base em dados divulgados pelo Ministério da Integração Nacional.

São 1.296 cidades, que pediram socorro ao governo federal para lidar com problemas que vão da falta de chuvas ao excesso delas.

A maior parte dos reconhecim­entos vigentes são por seca ou estiagem (71%), concentrad­os na região Nordeste e no norte de Minas Gerais.

Já tempestade­s, inundações, alagamento­s, enxurradas e deslizamen­tos, principalm­ente nas regiões Sul, Sudeste e Norte, são 29% das situações emergencia­is identifica­das pelo governo federal.

Há ainda cidades que estão em emergência tanto pela seca quanto pela chuva. É o caso de Novo Triunfo, na região nordeste da Bahia, cuja estiagem foi reconhecid­a pelo governo federal como emergencia­l em 9 de março.

A situação crítica, no entanto, não parou por aí. Choveu forte no fim do mesmo mês e, em 27 de março, a cidade baiana entrou em estado de emergência por causa das enxurradas, que destruíram calçadas e arrastaram carros na região urbana.

Duas capitais de Estados nordestino­s também precisaram pedir socorro. Em maio, as chuvas em Maceió mataram oito pessoas e deixaram milhares desabrigad­as. Já em Fortaleza, a falta d’água afetou 900 mil habitantes.

Até a capital do país teve que pedir ajuda. Brasília, que passa por um racionamen­to de água, esteve em emergência por vários meses, de fevereiro a agosto deste ano.

Além disso, há Estados quase inteiros em emergência, como a Paraíba, em que 196 das 223 cidades sofrem com a estiagem. VERBAS O governo federal analisa caso a caso e pode liberar verbas para os municípios afetados, além de permitir que os moradores atingidos saquem o FGTS (Fundo de Garantia por Tempo de Serviço) e o Bolsa Família.

As prefeitura­s podem ainda ser dispensada­s de fazer licitações para comprar produtos ou contratar serviços.

No total, o Ministério da Integração Nacional diz ter repassado, neste ano, R$ 200 milhões às cidades em situação de emergência, com ações de socorro, assistênci­a, restabelec­imento de serviços, kits de assistênci­a humanitári­a e recuperaçã­o de estruturas danificada­s.

O ministério aponta outros R$ 800 milhões gastos com a operação Carro-Pipa Federal neste ano, que levou água a 3,2 milhões de pessoas em um total de 861 municípios que convivem com a seca.

A maior obra de segurança hídrica, segundo o ministério, é a transposiç­ão do rio São Francisco, que vai beneficiar ao fim do projeto 12 milhões de pessoas, a um custo de R$ 9,2 bilhões.

Em 2015, o governo de Roraima precisou devolver R$ 4,6 milhões à União. A verba havia sido repassada sem que o Estado tivesse apresentad­o um plano de trabalho. O valor foi ressarcido após cobrança do Ministério Público Federal e da Controlado­ria Geral da União. RESERVATÓR­IOS De acordo com o Cemaden (Centro de Monitorame­nto e Alerta de Desastres Naturais), ligado ao Ministério da Ciência e Tecnologia, os Estados em situação mais crítica no Nordeste são Pernambuco, Ceará e Paraíba, cujos reservatór­ios hídricos operam com 8%, 8,4% e 8,7% de sua capacidade, respectiva­mente, de acordo com o órgão.

Mantida a seca severa até janeiro do ano que vem, os reservatór­ios podem ficar entre entre 5% e 7%.

Coordenado­r-geral de operações do Cemaden, o meteorolog­ista Marcelo Seluchi classifica a seca na região do semiárido nordestino, que já dura seis anos, como “sem precedente­s na história recente, pelo menos desde os últimos 200 anos”.

Segundo o meteorolog­ista, é difícil explicar a gravidade da situação, mesmo do ponto de vista científico. “Tivemos um El Niño intenso, que justifica parte do problema, mas que durou só um ano e meio. Há momentos em que não houve nem El Niño, nem La Niña e a seca continuou. Ainda estamos tentando entender o fenômeno.”

Bruno Dauster, secretário da Casa Civil da Bahia, Estado que tem 189 cidades em situação de emergência, diz que é preciso aprender a conviver com a estiagem.

“Na Bahia hoje nós não falamos mais em combate à seca. Essa visão tem que ser substituíd­a pela visão de convivênci­a com o semiárido. Não é fácil, mas é possível.”

Mesma visão tem o subchefe da Defesa Civil do Rio Grande do Sul, Jarbas Ávila. “Há 35 anos não víamos chuvas tão fortes”, diz ele, citando eventos entre maio e junho que destruíram cidades gaúchas.

“A solução seria tirar o rio ou tirar a cidade. Como nada disso é possível, só nos resta nos preparar para essas situações”, afirma.

Segundo Ávila, o reconhecim­ento da situação de emergência é essencial para reconstrui­r os danos causados pelos eventos climáticos. “Se cai uma ponte e deixa um bairro sem acesso a um hospital, o prefeito não pode abrir uma licitação e esperar 180 dias para começar a reconstrui­r”, diz.

Ele rechaça, no entanto, a ideia de que a prática abra mais possibilid­ades de esquemas de corrupção. “Não precisar fazer uma licitação porque a compra é emergencia­l não significa que não precisa prestar contas sobre a obra, como qualquer obra pública”, afirma.

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Rita Moura - 30.mai.2017/Folhapress Moradores enfrentam enchente em maio em Marechal Deodoro, uma das cidades de Alagoas atingidas por tempestade­s

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