Folha de S.Paulo

44ª SÃO PAULO FASHION WEEK Iódice festeja 30 anos com versão asseada de fetichismo

Grife abriu semana de moda com desfile disputado no Palácio Tangará

- PEDRO DINIZ

FOLHA

O que as mulheres gostam de vestir? Por muito tempo, quase 30 anos, Valdemar Iódice acreditou que seriam fendas, brilho e muito couro. Os tempos são outros, e a “mulher-gato” curvilínea foi substituíd­a por uma comportada, com pinta de galerista de arte moderninha.

A clientela, porém, é a mesma: mulheres da elite paulistana, que podem pagar alto por um vestido da marca. Foram elas que encheram o Palácio Tangará, hotel de luxo na zona sul, para o desfile que abriu oficialmen­te a 44ª São Paulo Fashion Week, no domingo (27).

Entre goles de espumante, lambidas em sorvete “premium” e mordidas em peras enroladas no presunto cru, não havia espaço para assuntos fora do círculo da moda e do motivo da festa. Emocionado nas coxias, Iódice dizia que a efeméride “é mais importante que a coleção em si”. Fez todo sentido no desfile.

Havia menos do legado da marca do que se esperava. A “tropical art” (arte tropical) que Iódice diz propor na coleção é um emaranhado de grafismos aplicados em vestidos esvoaçante­s. O brilho de outrora estava ali, às vezes pontual, outras exageradam­ente colado nos decotes de paetês prateados.

O estilista não economizou na matéria-prima. Haja cetim de seda, crepe e vinil para tantas variações da mesma ideia, tingida majoritari­amente com amarelo mostarda, off-white e “verde horizon”, tipo mentolado. A estética selvagem das franjas, fendas e decotes —que fizeram fama entre celebridad­es do universo SBT/Record— apareceu, mas contrapost­a a silhuetas alongadas e largas.

Um redemoinho de estampas coloridas (o tropical do nome da coleção) e rendas aplicadas com precisão matemática, para nenhuma pele fora do lugar aparecer, completam o estudo imagético.

O bloco mais interessan­te do desfile é justamente o das bases mais bem trabalhada­s à mão. Rendas e crochês em tons terrosos combinadas a bolsas tricolores com alças de macramê produziram a imagem de elegância tropical pretendida pelo estilista e por seu braço direito, Simone Nunes.

Nesta coleção, aliás, há mais a mão de Nunes, contratada em 2015 para gerenciar o estilo da marca, que o “Iódice way of life” —um tom fetichista que, levando em conta as escolhas recentes do patriarca da etiqueta, parece não agradar mais às mulheres.

Todos os elementos da história da Iódice parecem ter sido embalados em uma camada de seda higienizad­ora, asseada e pálida, como as paredes e o piso do Tangará.

“Poucas marcas conseguem sobreviver por tanto tempo”, disse Iódice sobre a conquista das três décadas. Saber a hora de mudar o figurino talvez seja a melhor forma de conseguir.

GIULIANA MESQUITA AVALIAÇÃO bom

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