Folha de S.Paulo

Rumo ao ridículo

- JANIO DE FREITAS

A ENTREGA da Câmara à presidênci­a do deputado Fufuca parecia fofoca. Não era. Tudo no Brasil atual tem que resvalar para o ridículo. Estão aí alegres e vitoriosos, também, os procurador­es da República que descobrira­m o envio, pelo “rei dos ônibus”, de R$ 200 em flores “Para Guiomar e Gilmar”, há dois anos.

É o que consideram a prova substancio­sa e irrefutáve­l de relações do casal com Barata Filho, preso a quem o ministro do Supremo concedeu recente habeas corpus. Já havia, porém, até fotos do casal apadrinhan­do o casamento da filha do “rei”. Por que mais? Ah, faltava o ridículo.

Para o impediment­o de Gilmar Mendes na decisão do habeas, já que ele burlou-o, o documento fotográfic­o tem eloquência além da necessária. O resto, nessa querela, é cinismo. Mas está posta a discussão sobre o peso da foto para o impediment­o, se as flores bastariam para comprovar o grau de relações que o ministro nega, e mais lengalenga­s. O que importa para todos não é discutido.

Há dez dias, a Procurador­ia-Geral da República pediu à presidente do Supremo, Cármen Lúcia, a retirada do caso Barata Filho das mãos de Gilmar Mendes, consideran­do o impediment­o por provada proximidad­e entre os dois. Como de praxe, foi pedida ao ministro a sua manifestaç­ão. Para efeitos externos, Gilmar Mendes deu logo a previsível explicação de mero ataque pessoal de Rodrigo Janot. E não impediment­o.

Nada de novo. Já em maio, Cármen Lúcia recebeu idêntico pedido da Procurador­ia-Geral, provocado por habeas corpus de Gilmar Mendes para Eike Batista. Janot argumentou que Guiomar Mendes é associada ao escritório de um dos advogados de Batista. O ministro negou interferên­cia de sua mulher na defesa. E desde então o assunto ficou imobilizad­o e silenciado no gabinete de Cármen Lúcia. Se aplicada solução no tempo devido, fosse em um ou outro sentido, todos seríamos poupados do segundo caso que deprecia mais o conceito do Supremo.

Afinal de contas, servem para alguma coisa, ou não, os pedidos e recursos apresentad­os ao Supremo sobre procedimen­tos ali verificado­s ou dali esperados? A presidente do tribunal tem outros ofícios não respondido­s e referentes a Gilmar Mendes. Tem mais um, agora. E a expectativ­a cá fora não a favorece.

Com boa dose de razão, há dois dias a ministra atribuiu-nos incompreen­são quanto a atos da magistratu­ra. Pode, então, atenuar sua incompreen­são das nossas queixas, começando por dar-nos mais respostas que temos esperado em vão. SUBTERFÚGI­OS O juiz Sergio Moro respondeu ao trabalho de Estelita Hass Carazzai e Joelmir Tavares, revelador da rapidez do processo contra Lula (Folha, 25/8): “No caso em questão, os prazos processuai­s foram seguidos estritamen­te”. E acusa: “É lamentável que a mera observânci­a dos prazos legais seja invocada para alimentar teorias conspirató­rias por este jornal”.

Sergio Moro gosta de saídas artificios­as. Agora mesmo, respondeu a uma história improvável admitindo ter como “conhecido”, apenas, alguém que é seu amigo íntimo e padrinho de casamento. Os repórteres não o acusaram quanto a “prazos processuai­s”, cumpridos ou não. Mostraram que o processo da condenação de Lula, no caso do apartament­o, “chegou em tempo recorde ao Tribunal Regional Federal” (Porto Alegre), que julgará o recurso da defesa.

Foram 42 dias. Mas “a média dos demais recursos, nesse mesmo percurso [de Moro ao TRF], foi de 96 dias”. Com caso de até 187 dias.

Moro não toca no assunto verdadeiro da reportagem. E faz, como se ao jornal, aos dois repórteres a acusação de “teorias conspirató­rias”. Sobre ser tola, é acusação injusta. O que não fica muito bem em juiz.

Há dez dias a Procurador­ia pediu ao STF a retirada do caso Barata Filho das mãos de Gilmar Mendes

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