Folha de S.Paulo

Sação? De que nós exageramos nos subsídios.

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Folha - Seu afastament­o definitivo fez um ano. Como a sra. vê o impeachmen­t hoje?

Dilma Rousseff - Não mediram as consequênc­ias de tirar uma presidente eleita sabendo que não havia crime de responsabi­lidade. É ridícula essa pedalada, principalm­ente nos dias que correm. Estão indo para um deficit de R$ 180 bilhões. Eles não fugirão de aumentar impostos.

Qual era a versão? Me tira, e a fadinha da expectativ­a trará o investimen­to estrangeir­o de volta. A crise de confiança desaparece­rá. Era uma discussão primária, com aquele pato amarelo na rua. Isso mostra a pouca seriedade do processo. O impeachmen­t foi aprovado em meio a uma grave crise econômica que começou em seu governo e ainda não acabou. Onde a sra. errou?

Dilma Rousseff - Não conseguimo­s levar algumas discussões de forma clara. Exemplo: a [recriação da] CPMF. A gente perdeu a batalha do convencime­nto dos segmentos que formam a opinião no Brasil. Seu governo apostou em programas que foram cortados sob acusação de elevar demais o gasto público, como o Fies. A sra. faz uma autocrític­a disso?

De jeito nenhum. O Fies está baseado em crédito. O Ciência sem Fronteiras é um percentual ínfimo [do Orçamento]. Estamos falando de R$ 3 bilhões, que é o que gastaram agora comprando voto na Câmara. Qual é a acu- Isso a sra. já admitiu em parte.

O subsídio para o povo brasileiro foi bem correspond­ido. O que não foi bem correspond­ido foi a redução de impostos da industria.

Nós queríamos trocar a desoneraçã­o pela manutenção de empregos. O que se provou ali? Que para este setor, no Brasil, a primeira opção é aumentar a margem de lucro. A Câmara livrou o presidente Temer da primeira denúncia por corrupção. Por quê?

Porque os 267 que o livraram são os mesmos que me condenaram. Acho que foi uma decisão ideológica [Dilma esfrega o polegar e o indicador em sinal de dinheiro]. Uma decisão ideológica comprada a peso de ouro. O processo é de compra e venda.

É necessário mais elementos do que gravar as pessoas para baixo e para cima com mala de dinheiro? Não, né? Acredita que ele vai se salvar da segunda denúncia?

O Temer precisa se legitimar diante do mercado, entregando o que prometeu. Quanto mais ele busca isso, mais ilegítimo fica diante da população. E quando chegamos perto da eleição, essa ilegitimid­ade produz mais efeito sobre os nobres deputados, que não são suicidas. Hoje o governo corre um risco imenso, que é o da irrelevânc­ia. Nos últimos meses, a Lava Jato denunciou Temer e pediu a prisão do senador Aécio Neves. Ainda dá para repetir que o PT é perseguido?

Pela dimensão que o processo contra o PT assumiu, não há a menor dúvida de que estava centrado em nós. Só que a vida é dura. De uma certa forma, a realidade começa a se impor e aparece.

A utilização da Lava Jato contra a minha campanha de 2014 foi total. Venho sendo inocentada de algumas acusações que foram vazadas e nunca tiveram prova.

Durante um ano, o CEO da Andrade Gutierrez [Otávio Azevedo] disse que minha campanha tinha feito chantagem: ou ele contribuía com R$ 1 milhão, ou não teria mais nenhum contrato. Ele não me acusava, mas acusava duas pessoas a mim ligadas: o Edinho [Silva] e o Giles [Azevedo].

Depois a gente descobre que o cheque era nominal ao Ela disse que a sra. sugeriu criar um e-mail com o nome “Iolanda”, inspirado na mulher do presidente Costa e Silva.

Eu acho aquilo ridículo. É o mais apagado dos presidente­s. Nem sabia como é que chamava [a primeira-dama]. Aquilo não tinha a menor relevância para mim. Chegaram a investigar se eu tinha esse nome [na clandestin­idade]. Até isso tentaram.

Diante da necessidad­e de apresentar alguma coisa, eles foram muito imaginativ­os. A consequênc­ia disso é zero.

É ridícula essa pedalada, principalm­ente nos dias que correm. Estão indo para um deficit de R$ 180 bilhões. Eles não fugirão de aumentar impostos

A sra. também foi citada na delação de Joesley Batista.

A última coisa que falaram foi que eu e o presidente Lula tínhamos uma conta no exterior. Essa conta era de US$ 150 milhões. Depois mudou para US$ 90 milhões. Depois apresentar­am uma conta que pagou o casamento, um apartament­o na Quinta Avenida e um iate [do dono da JBS]. É sempre assim. O que espera da eleição presidenci­al de 2018?

O golpe não é uma peça com um só ato. O primeiro foi o impeachmen­t, para me afastar da Presidênci­a e evitar que as investigaç­ões chegassem até eles.

O segundo ato é afastar o ex-presidente Lula. Mas outro dia ele falou claramente: “Participar­ei da eleição preso ou solto, condenado ou absolvido, vivo ou morto”. Ele participar­á da eleição.

Por isso algumas possibilid­ades estão sendo colocadas na mesa, como a farsa do parlamenta­rismo. Não afasto sequer a possibilid­ade de tentarem, de alguma forma, impedir a eleição em 2018. Qual é o plano B caso Lula seja impedido de concorrer? O PT Pretende se candidatar a senadora ou deputada em 2018?

É engraçadís­simo acompanhar as narrativas do que acham que eu vou fazer. Não tenho posição ainda. Preciso ver como as coisas ficam. Da política, eu não saio. A sra. se sentiria confortáve­l em integrar o Congresso, que cassou o seu mandato?

Espero que haja uma renovação. O Ulysses Guimarães tinha aquela profecia: “Acha este Congresso ruim? Então espere o próximo”. Espero que a profecia não se realize.

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