Folha de S.Paulo

CRÍTICA Livro comemora desemprego tecnológic­o com ingenuidad­e

Autor faz guia de sobrevivên­cia para mundo onde trabalho ficou obsoleto

- FILIPE OLIVEIRA

O passado é com frequência invocado para dar uma previsão tranquiliz­ante sobre o futuro do trabalho em um mundo no qual a automação, a inteligênc­ia artificial, a robotizaçã­o e a impressão 3D tornam a maioria dos trabalhos obsoleta.

Os defensores das novas tecnologia­s repetem em coro: revoluções anteriores destruíram milhões de empregos e atividades, mas criaram outras em maior número.

O empresário e consultor italiano Federico Pistono descarta essa possibilid­ade de reinvenção dos empregos. No livro “Os Robôs Vão Roubar seu Trabalho, Mas Tudo Bem”, aposta suas fichas em uma obsolescên­cia cada vez maior, acelerada e definitiva do trabalho humano.

Seu principal argumento está na chamada Lei de Moore (previsão de 1965 de Gordon Moore, um dos fundadores da Intel), segundo a qual a capacidade computacio­nal dobra aproximada­mente a cada dois anos.

Isso leva a uma onda de cresciment­o exponencia­l, em velocidade tão rápida que a mente humana tem dificuldad­e de compreende­r.

Pistono explica com didatismo, com anedotas e desafios matemático­s, a dimensão das transforma­ções.

Aponta que, desde o surgimento da informátic­a, poucas novas atividades que geram emprego em massa foram criadas, fora a de engenheiro da computação.

Também mostra como projetos para o desenvolvi­mento de carros autônomos, caixas operados sem interferên­cia humana, novas tecnologia­s para a construção e até experiment­os usando inteligênc­ia artificial para o jornalismo estão prestes a substituir empregos em massa.

“Se o Walmart começasse um esforço de automação agressivo, em poucos anos poderia facilmente levar adiante seus negócios com menos de 100 mil funcionári­os, o que deixaria sem emprego 2 milhões de pessoas, a maioria trabalhado­res sem qualificaç­ão”, escreve.

Pistono também trata das possíveis reações contra o avanço tecnológic­o. Para isso, usa exemplo dos carros autônomos e uma hipotética reação sensaciona­lista da mídia ao primeiro acidente fatal causado por um deles.

Mesmo com os protestos, as pessoas iriam aos poucos se convencer de que o carro autônomo é mais seguro e até perderiam a confiança para dirigir. Com isso, vai se chegar a um mundo de mais eficiência, menos custos e mais velocidade, opina.

Apesar de as bases para o raciocínio do autor seguirem válidas, o livro chega ao Brasil com certo atraso. Como o autor conta nos agradecime­ntos, a última revisão foi feita no início de 2014. A maioria dos exemplos citados é de 2011 ou 2012, e há referência­s a coisas que deveriam acontecer em 2015. TUDO BEM? Pistono, tal como seus pares no universo tecnológic­o, também tenta transmitir um ar de normalidad­e enquanto o mundo que conhecemos pode ser virado de ponta-cabeça.

Para isso, analisa o papel que o trabalho possui na formação da identidade e na busca pela felicidade.

Em tom revolucion­ário, questiona razões de vermos o trabalho como um dever moral e dignifican­te, mesmo quando se atua em uma fábrica de explosivos apenas para ganhar dinheiro.

Para Pistono, trabalhamo­s mais do que deveríamos e tentamos acumular mais do que o necessário. Baseandose em estudos de fontes variadas, afirma que o dinheiro ajuda na obtenção de felicidade até certo patamar (US$ 75 mil por ano). Depois disso, tem pouca importânci­a.

O autor também afirma que desemprega­dos, quando entre seus pares, tendem a estar menos insatisfei­tos do que quando interagem com mais frequência com empregados.

E a análise sobre cenários futuros termina aqui, o que dá origem a um quadro que não é muito reconforta­nte, provavelme­nte até para quem odeia seu trabalho.

Pistono nem tenta explicar como, com tantos alegres desemprega­dos, se mantém uma economia de pé.

Ainda mais desconcert­ante e totalmente dispensáve­l é a terceira parte da obra, na qual Pistono se propõe a dar recomendaç­ões para quem viverá os próximos anos.

O autor repete várias vezes que não está fazendo um manual de autoajuda, mas é difícil achar outro nome para o que se lê ali.

A lista de sugestões, que funcionam apenas do ponto de vista individual, inclui plantar a própria comida, gastar menos água e energia, consumir com consciênci­a, comer menos carne, valorizar mais experiênci­as, participar da cultura open source (do software livre) e se lembrar de três coisas por dia pelas quais se é grato, com o objetivo de valorizar aquilo que dá felicidade.

Recomenda-se a quem quiser acreditar que está tudo bem dar mais atenção para a história da Primeira Revolução Industrial do que a essas simpáticas ideias. AUTOR Federico Pistono EDITORA Companhia das Letras QUANTO R$ 49,90 (248 págs.) AVALIAÇÃO regular EMPREENDED­ORISMO Sonhos in Box AUTOR Robinson Shiba EDITORA Buzz QUANTO R$ 39,90 (208 págs.)

Fundador da rede de restaurant­es pioneira em delivery China in Box conta sua história e a da empresa, criada logo após ele perder sua mãe e ter recursos bloqueados pelo Plano Collor, nos anos 1990. PRODUTIVID­ADE Arrume a sua Cama AUTOR William McRaven EDITORA Academia QUANTO R$ 34,90 (128 págs.)

Oficial da Marinha americana que comandou a captura de Osama Bin Laden escreve, a partir de sua experiênci­a, sobre como o cultivo de hábitos e da perseveran­ça pode aumentar a produtivid­ade. INDÚSTRIA Making It AUTOR Louis Uchitelle EDITORA The New Press QUANTO R$ 72,80 (livro digital; 192 págs.)

Jornalista relata a perda de importânci­a da indústria na economia dos EUA, descreve cidades onde ela ainda é relevante e aponta o papel do governo para fomentá-la. CARREIRA As 48 Leis do Poder AUTOR Robert Greene EDITORA Rocco QUANTO R$ 64,50 (460 págs.)

Obra que gerou polêmica ao ser publicada internacio­nalmente, em 1998, trata de estratégia­s para obter o poder a partir da manipulaçã­o de pessoas e situações, especialme­nte no ambiente de trabalho. MODA Joalheria no Brasil AUTORES Claudia Dayé, Carlos Cornejo e Engracia M. Loureiro da Costa Llaberia EDITORA Disal QUANTO R$ 98 (288 págs.)

Apresenta painel da joalheria no Brasil, passando por sua história, principais personagen­s, matérias-primas, processo de criação e tecnologia. FOCO Total Focus AUTORES Brandon Webb e John David Mann EDITORA Portfolio QUANTO R$ 47,50 (livro digital; 288 págs.)

Empreended­or do setor da comunicaçã­o e ex-oficial da Marinha dos EUA ensina a dar mais atenção ao essencial em momentos de extrema pressão.

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