OPINIÃO Google peca em transparência ao financiar centros de estudo
A primeira coisa que se vê ao entrar na New America Foundation é o Eric Schmidt Ideas Lab, espaço que leva o nome do presidente do conselho da Alphabet, que controla o Google. A fundação de Schmidt e de sua família é a principal fonte de verbas para o centro de estudo.
Na quarta (30), Anne-Marie Slaughter, presidente da New America, divulgou comunicado afirmando que Barry Lynn, um dos dos mais conhecidos pesquisadores da instituição, fora demitido por “sua reiterada recusa em aderir aos padrões de transparência e coleguismo institucional”.
Qual foi o ato terrível e perigoso que Lynn cometeu? Escreveu um artigo para o site da New America no qual expressa apoio à multa de US$ 2,7 bilhões imposta pela União Europeia ao Google por violações das leis antitruste.
A publicação se enquadrava perfeitamente ao trabalho na iniciativa Open Markets [Mercados Abertos], que ele comanda e que vem sendo uma das vozes mais fortes em Washington em favor de fiscalização das violações antitruste na economia dos EUA.
Foi essa a plataforma que Lynn, Matt Stoler e Lina Khan usaram para apelar por escrutínio regulatório de monopólios tecnológicos como Google, Amazon e Facebook.
Mas o poder financeiro do Google sobre a New America é aparentemente tão grande que conseguiu forçar o fim das atividades do grupo. Ainda que Slaughter negue a conexão entre o financiamento do Google à fundação e a decisão que ela tomou, a implicação parece clara. Uma empresa cujo lema um dia foi “não seja mau” não tem interesse em ser classificada como monopólio por um centro de pesquisa que ela banca.
Em seu livro “Zero to One”, Peter Thiel, investidor no setor de tecnologia, afirma que empresas como o Google mentem para se proteger. “Elas sabem que, caso se vangloriem sobre seus grandes monopólios, correm o risco de auditorias, investigações e ataques. Como querem muito que seus lucros continuem inalterados, tendem a fazer o que podem para esconder seus monopólios —em geral ao exagerar o poderio de seus concorrentes [inexistentes].” Há provas de que esses exageros são propalados por numerosos pesquisadores e centros de estudo cujo trabalho é bancado pelo Google.
Segundo reportagem que o “Wall Street Journal” publicou em 2017, “ao longo dos dez últimos anos, o Google ajudou a financiar centenas de pesquisas para se defender contra desafios regulatórios ao seu domínio de mercado, pagando entre US$ 5.000 e US$ 400 mil por projeto individual de pesquisa”.
Mas, como descobriu a ONG Consumer Watchdog, as verbas do Google vêm acompanhadas por restrições.
Bob Boorstin, diretor de comunicações sobre política pública do Google, escreveu à Rose Foundation (grande financiadora da Consumer Watchdog) reclamando da organização e solicitando que a fundação considerasse “se não há grupos melhores aos quais dedicar recursos”.
Boorstin pediu desculpas por tentar paralisar um crítico do Google, mas não existem provas de que o emprego dessa tática tenha acabado.
O lema “não seja mau” que o Google adotou dava a entender que a empresa conferia valor à transparência. No entanto, a dimensão de sua influência não é nem um pouco transparente. JONATHAN TAPLIN PAULO MIGLIACCI