Folha de S.Paulo

HQ reflete sobre abordar garotas em festas

Fábio Moon e Gabriel Bá falam hoje à noite, na Bienal do Livro do Rio, sobre sua adaptação de conto de Neil Gaiman

- AMANDA RIBEIRO

Dupla de quadrinist­as brasileiro­s afirma se identifica­r com aqueles jovens retraídos que não sabem como interagir

Quando os quadrinist­as brasileiro­s Fábio Moon e Gabriel Bá receberam uma ligação da editora americana Diana Schutz dizendo que a Dark Horse Comics havia comprado os direitos de alguns contos de Neil Gaiman, a última coisa que queriam era fazer uma nova adaptação.

À época, a dupla ainda trabalhava na graphic novel “Dois Irmãos” —baseada na obra homônima de Milton Hatoum—, que depois venceria o Prêmio Eisner (o Oscar dos quadrinhos) de adaptação.

Mas, segundo Moon, o convite era “irrecusáve­l”. Quase dois anos mais tarde, em 2016, o livro foi publicado nos Estados Unidos. Depois de mais um ano, o quadrinho “Como Falar com Garotas em Festas” chega às livrarias brasileira­s pela Companhia das Letras.

A história, que se passa na Londres de 1970 e mescla fantasia e ficção científica, conta a história de Enn e Vic, dois adolescent­es de 15 anos que foram convidados para uma festa que não sabem onde é.

Enquanto Vic é bonito e tem as garotas aos seus pés, Enn é tímido e não sabe como se aproximar delas. Expressand­o seus temores ao amigo, recebe o conselho de só tentar conversar com as meninas. “Elas não vêm de outro planeta.”

Os acontecime­ntos que se seguem à chegada dos dois adolescent­es à festa provam que Vic estava errado.

Tirando os aspectos fantástico­s, o enredo lembra um pouco a juventude de Moon e Bá, adolescent­es retraídos que nunca encontrava­m brechas para conversar com garotas.

“Um dos motivos de gostarmos dessa história é porque nos identifica­mos com ela. As mulheres sempre foram um desafio para nós”, diz Moon.

O esforço para vencer a falta de desenvoltu­ra foi convertido em arte e influencio­u a temática do relacionam­ento, que permeia toda a produção dos artistas, vencedores de dois Eisner —além de “Dois Irmãos”, também “Daytripper” (Panini, 2011) levou o prêmio.

“Fazemos histórias de relacionam­ento para aprendermo­s a nos relacionar. O quadrinho era um ensaio, uma tentativa de prever como chegar em festas e conversar com uma menina. Nos quadrinhos, a gente fazia o que queria fazer na vida real”, diz Moon.

Essa identifica­ção com a personalid­ade do protagonis­ta pode ter sido um dos motivos que levaram, em um primeiro momento, o desenho de Enn a lembrar um pouco a maneira como Bá e Moon desenham a si próprios.

Essa, na verdade, é uma tendência quase automática que os irmãos têm ao desenhar: em um primeiro mo-

FÁBIO MOON

quadrinist­a mento, todos os personagen­s são variações deles mesmos.

“A gente tem uma imagem de personagem na cabeça que é meio uma versão de nós. Somos magros, narigudos e orelhudos. Então o molde mais fácil de imaginar é o de personagen­s que são uma variação disso”, afirma Moon.

No entanto, no fim das contas, Enn acabou se parecendo com o próprio Neil Gaiman, que enviou fotos de quando era adolescent­e para servirem de base para o personagem, criado como uma espécie de “alter-ego” do autor.

Além de enviar as fotos e acompanhar o processo de produção, Gaiman não fez grandes intervençõ­es durante o processo de adaptação do conto que publicou em 2007.

Ocupados com projetos que desenvolve­m ao lado de outros autores, como as séries “Casanova” —produzida por Moon e Matt Fraction— e “Umbrella Academy” —produzido por Bá e o ex-vocalista da banda My Chemical Romance, Gerard Way— os irmãos contam não ter nenhum outro projeto conjunto em vista.

O objetivo de ambos, no entanto, está definido: continuar fugindo do lugar-comum dos quadrinhos e mostrando aos leitores que as HQs vão muito além de histórias de herói, faroeste e ficção científica.

“Temos que tentar fugir das fórmulas prontas. Tentar contar outras histórias. Precisamos mostrar que existe uma história certa para cada um”, afirma Gabriel Bá.

“histórias de relacionam­ento para aprendermo­s a nos relacionar. O quadrinho era um ensaio, uma tentativa de prever como chegar em festas e conversar com uma menina

AUTORES Fábio Moon e Gabriel Bá EDITORA Quadrinhos na Cia. QUANTO R$ 44,90 (80 págs.) LANÇAMENTO neste sáb. (2), às 19h, no Pavilhão Verde da Bienal do Rio, no Riocentro (av. Salvador Allende, 6.555); de R$ 12 a R$ 24 (no site ingressora­pido.com.br)

 ?? Reprodução ?? Página da recém-lançada versão de Fábio Moon e Gabriel Bá para conto de Neil Gaiman
Reprodução Página da recém-lançada versão de Fábio Moon e Gabriel Bá para conto de Neil Gaiman

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil