Folha de S.Paulo

Em áudio, executivos falam em ‘dissolver o Supremo’

Cármen Lúcia diz que STF foi agredido de forma inédita e pede investigaç­ão

- DE BRASÍLIA EM PARIS

Um dos citados pelos delatores da JBS nas conversas, Gilmar Mendes afirma que Janot quer ‘sua cabeça’ FOLHA FOLHA,

O empresário Joesley Batista, da JBS, e seu subordinad­o Ricardo Saud falam em “dissolver o Supremo” em um dos trechos das novas gravações entregues por eles à Procurador­ia-Geral da República na semana passada.

Na conversa, Joesley sugere que o objetivo seria atingido via José Eduardo Cardozo, ex-ministro do governo Dilma.

“Eles vão dissolver o Supremo. Eu vou entregar o Executivo e você vai entregar o Zé e o Zé vai entregar o Supremo”, afirma Joesley. Procurado, Cardozo não quis se manifestar.

Nas conversas, Joesley e Saud citam três ministros do STF, Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowsk­i e Gilmar Mendes, sem relacioná-los a qualquer ato ilícito. O teor indica mais uma tentativa dos então futuros delatores de tentar entender como influencia­r decisões do Judiciário.

O conteúdo da gravação, tornado público nesta terçafeira pelo site de “O Globo”, se choca com a declaração dada na segunda (4) pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, em entrevista.

Segundo Janot, que na ocasião se recusou a dar detalhes, o áudio conteria indícios de “atos ilícitos” no STF e na Procurador­ia-Geral da República.

Os nomes de dois dos ministros foram citados por Saud quando ele trata da eventual contrataçã­o de José Eduardo Cardozo.

Segundo Saud, havia uma tese do procurador da República Marcello Miller, que na época estava auxiliando os executivos, a formatarem seus anexos para o acordo de delação premiada, que seria fechado com a PGR em maio.

“Ele [Miller] acha que o [exministro da Justiça] Zé Eduardo [Cardoso] é o melhor caminho para chegar no Supremo”, disse Saud. O executivo sugere que a PGR pretendia investigar ministros do tribunal, mas não cita nomes.

Na sequência é feita a menção à ministra Cármen Lúcia, presidente do STF.

Cardozo teria dito a Saud e Joesley, em uma outra reunião supostamen­te gravada, cujo áudio não consta da investigaç­ão, que ele tinha proximidad­e com a ministra. Não há nenhuma prova disso.

Em outro trecho da gravação, Saud afirma que teria dito a Miller que Cardozo lhe disse ter “cinco ministros” do Supremo “na mão dele”. Novamente a expressão não é explicada.

De acordo com Saud, Miller desconfiou dessa conta. “Ele [Miller] falou: ‘Cinco ele não tem, não. Só se eles contam o Lewandowsk­i até hoje’. [Saud respondeu] ‘Ah, isso aí eu não sei’. Deu nome lá. ‘Se contar o Lewandowsk­i acho que têm cinco’”, disse Saud a Joesley, na conversa gravada. A passagem é a única que faz referência a Lewandowsk­i. GILMAR A citação ao terceiro ministro, Gilmar Mendes, é ainda mais vaga.

Saud disse ter comentado com Miller que “eles”, ou seja, a PGR, iriam “esquecer aquele trem da briga do Gilmar”, em referência a divergênci­as entre Janot e Gilmar Mendes.

Em entrevista em Paris, Gilmar disse nesta terça que não está preocupado com seu nome ter sido citado.

“Um dos objetivos [citados nos novos áudios] era me gravar, entregar a minha cabeça, porque era assim que o Janot operava”, afirmou.

“Isso tudo mostra que estão usando a delação premiada para outra finalidade, para vingança política.” REAÇÃO A presidente do STF, Cármen Lúcia, informou na noite desta terça (4) que pediu à Polícia Federal e à PGR uma investigaç­ão imediata para apurar as declaraçõe­s feitas pelos executivos.

“Agride-se, de maneira inédita na história do país, a dignidade institucio­nal deste Supremo Tribunal Federal e a honorabili­dade de seus integrante­s”, disse, em pronunciam­ento, Cármen Lúcia.

Para a ministra, “impõe-se, pois, com transparên­cia absoluta, urgência, prioridade e presteza à apuração clara, profunda e definitiva das alegações, em respeito ao direito dos cidadãos brasileiro­s a um Judiciário honrado”.

(MÔNICA BERGAMO, RUBENS VALENTE, REYNALDO TUROLLO JR., LETÍCIA CASADO E MÁRIO CAMERA)

 ??  ??
 ?? Pedro Ladeira/Folhapress ?? A presidente do STF, Cármen Lúcia, em seu gabinete
Pedro Ladeira/Folhapress A presidente do STF, Cármen Lúcia, em seu gabinete

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil