Folha de S.Paulo

Carta aberta aos sem noção

- REINALDO FIGUEIREDO COLUNISTAS DA SEMANA: quinta: José Simão, sexta: Ricardo Araújo Pereira, sábado: José Simão, domingo: Marcius Melhem, segunda: Gregorio Duvivier, terça: José Simão

COM A recente inauguraçã­o do Blue Note Rio, que faz parte de uma importante rede internacio­nal de clubes de jazz, acho que é chegada a hora de publicar esta carta aberta aos caras que falam alto pra caralho durante shows de música ao vivo.

Pensem bem: vocês gastam uma grana num ingresso ou couvert artístico para ficar falando alto durante um show. Enquanto isso, o pessoal que foi lá por causa da música tem que ficar ouvindo um cara contando, em altos brados, como foi estressant­e o seu exame de próstata. Ou ouvindo a mulher dele reclamar da babá, do personal trainer e do passeador de cachorros. Não seria menos “sem noção” vocês irem para um outro bar, sem música ao vivo?

O interessan­te é que, às vezes, vocês são bem intenciona­dos. Uma noite dessas, eu estava num show do guitarrist­a Ricardo Silveira e, na mesa ao lado, um cara não parava de falar com seus amigos, fazendo altos elogios ao músico, mas falando alto pra caralho: “Eu não disse pra vocês que esse show era bom? O Ricardo Silveira é foda!”.

E começou a falar de outros shows de guitarrist­as que ele tinha visto, em Nova York e em Paris. O cara não parava de falar. Me deu vontade de dar um toque, do tipo “meu amigo, eu já sei que você gosta do guitarrist­a, mas eu não estou conseguind­o ouvir, para poder formar a minha própria opinião”. Mesmo sendo um sem noção do bem, esse aí aporrinhav­a todas as mesas que estavam em volta.

Felizmente, no Rio de Janeiro já existe um lugar, chamado Triboz, que aparenteme­nte é um bar normal, mas que na verdade é um lugar onde acontecem shows. As pessoas vão lá para saborear música, mas conversam normalment­e antes e depois dos shows, e durante os intervalos. Por que vocês acham que isso é um conceito tão estranho? Por acaso vocês vão ao cinema só para comer pipoca e ficar conversand­o durante a projeção do filme?

Ouvi falar que alguns de vocês já estão fazendo isso. Se for verdade, então fudeu tudo.

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Uma página dos diários de Leonard Plume, crítico de jazz da revista “Down Bitch”

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