Folha de S.Paulo

Elenco garante bons momentos, mas alegorias atrapalham longa

- CÁSSIO STARLING CARLOS

FOLHA

A escolha de títulos minimalist­as costuma servir para destacar o contrário, a complexida­de de uma trama ou da maneira de contá-las. “O Jantar” usa o artifício nesse sentido, convocando o espectador a sair do habitual torpor.

O contraste visa provocar surpresas e transmitir a sensação de que estamos diante de um produto elaborado, o contrário de um filme-pipoca.

O primeiro sinal dessa ambição aparece na maneira como se apresenta o grupo de personagen­s por meio de situações sem conexão aparente.

Numa festa adolescent­e vemos três garotos saírem dos limites e um deles começa a passar mal. Em seguida, um casal discute a necessidad­e de ir a um restaurant­e sofisticad­o e afetado. Outro par, em contraste com o anterior, dirige-se a um compromiss­o social, mas a comunicaçã­o entre eles parece quase rompida.

Aos poucos, conectam-se como partículas da mesma família, ligadas afetivamen­te, mas também afastadas por diferenças e ressentime­ntos.

O reencontro dos irmãos Paul (Steve Coogan) e Stan (Richard Gere) com as respectiva­s esposas, Claire (Laura Linney) e Katelyn (Rebecca Hall), em um jantar é estruturad­o conforme a ordem da refeição.

A relação truncada entre eles é reiterada pela intromissã­o do maître, que a todo momento interrompe a conversa para apresentar os pratos.

A situação é marcada pela teatralida­de, aspecto que reforça a impressão de convivênci­a forçada, de que algo está oculto por máscaras prestes a cair e revelar algo grave.

O filme, porém, não demora a se tornar refém de seus artifícios. A concentraç­ão em um espaço único alcança bons momentos graças às qualidades do elenco, mas a tendência ao blá-blá-blá dramático também provoca cansaço.

Quando escapa do enclausura­mento por meio de recuos temporais e da invasão de um grave impasse moral, “O Jantar” ainda acumula outras camadas, ameaçando-nos com uma perigosa indigestão.

A ressurgênc­ia de fantasmas da Guerra Civil americana como alegoria de fraturas históricas não curadas traz outras complicaçõ­es que o filme apenas amontoa.

O trabalho do diretor Oren Moverman se aproxima do molde do cinema engajado praticado por realizador­es como Martin Ritt e Alan J. Pakulla nos anos 1970 e 1980.

Lá e cá, registramo­s a mensagem, mas pouco do filme é digno de memória. (THE DINNER) DIREÇÃO Oren Moverman ELENCO Richard Gere, Steve Coogan, Laura Linney, Rebecca Hall PRODUÇÃO EUA, 2017, 16 anos QUANDO estreia nesta quinta (7) AVALIAÇÃO regular

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